27 setembro 2007

rizomas

dou graças a aracy lopes da silva o rizoma na obra de viveiros de castro;
em seu texto pequenos xamãs ela faz uma extensa citação que me ganhou com a noção de corporalidade, qualquer coisa como a corporalidade como categoria central da constituição do conhecimento indígena;
isso, somado ao xamanismo me fez bater no perspectivismo;
daí não saí, roí o osso do perspectivismo por anos, converti-me e comecei a pregar;
fiquei possuído por aquele texto que não cessava de se desdobrar;
com ele, aprofundei-me no problema epistêmico da natureza e do objeto, da objetividade que caracteriza nossa matriz filosófica;
tais problemas ganharam uma dimensão fundamental em minha dissertação que aí, já quase na final, encontra seu problema teórico, articulando-o aos meus problemas de campo: ritual, canto-dança, xamanismo, inspiração, êxtase, conhecimento guarani;
quando pensava que tinha chegado, encarei o perspectivismo com uma turma de ciências sociais, no sexto período, era a primeira vez que dava antropologia educacional;
entrei pela corporalidade com a aracy e mandei o perspectivismo amortecido por uma entrevista com o autor;
o lombo das gentes estalou, foram aulas inesquecíveis, para mim certamente;
um de meus alunos me disse algo que não esqueci, também pudera, disse que tinha aprendido naquele curso o que não aprendera em anos de universidade federal;
o problema era as imagens da natureza de um lado no idealismo do conhecimento positivista da tradição ocidental em polêmica com, de outro, a corporalidade o xamanismo indígena imaginado pelo perspectivismo;

depois de tantos anos e linhas escritas sobre a imaginação da natureza nos saberes e nas instituições indigenas que atinei para o problema supostamente simétrico e oposto da imagem de sociedade imaginado e problematizado em nossa tradição;

a solução da antropologia regional para o problema de classificação da morfologia social colocado pelas sociedades ameríndias foi operar com dispositivos híbridos, as sociocosmologias, que traziam a dimensão simbólica articulada aos dados empíricos;
a idéia foi trazer para o jogo as definições de socialidade nativas, redefinindo a tradição descritivista do empirismo europeu;
a corporalidade foi uma das dimensões fundamentais nessa transposição;
cabia à antropologia regional levar a sério o animismo e as metamorfoses do xamanismo indígenas para chegar às formas dessa socialidade;
por aí se chega ao perpectivismo que não se restringe a uma epistemologia como pensava no tempo da dissertação e conforme o autor em o nativo relativo;
ele possui essa dimensão social, essa imaginação da socialidade, que foi por onde a antropologia brasileira pode dar conta de definir elementos que dessem conta da morfologia social ameríndia;


assim que, articulada à metamorfose, a guerra tornou-se outra instituição central para a compreensão dessa socialidade;
por extensão à guerra, o sistema de parentesco foi revisto a partir da instituição da afinidade pelas alianças de casamento;
sabe-se que entre os grupos guerreiros as alianças de casamento, constituindo relações de afinidade através da troca de mulheres tem papel contitutivo;
a guerra que está vinculada em nossa concepção contratualista de sociedade à dissolução social, pode assim ser elemento constitutivo da socialidade ameríndia;

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ecologias e monoculturas

me parece que a noção de certo e errado, muito importante para a matemática, onde tem uma função, foi propositadamente migrando para outras disciplinas;
e nessas disciplinas formou o imaginário pedagógico e o seu status social;
isso prejudicou essas disciplinas na medida em que as definiu a partir de um padrão único, o que é certo, tolhendo o seu caráter experimental;
a tarefa hoje da pedagogia, com apoio das teorias elaboradas nos campos específico de cada disciplina, consiste em abolir esse imaginário do unidimensional;
a disciplina que está adiantada, apesar de seu imaginário ainda impregnar-se de pedantismo de norte a sul, é a língua portuguesa;
também pudera um único idioma para um território e um continente populacional como os do brasil, só um povo muito massacrado para sustentar;
o fato é que as últimas décadas conheceram, ou melhor, tiveram contato com a noção despadronizada de línguas portuguesas;
esse imaginário da multiplicidade é fundamental para que uma grande reformulação epistêmica que já se consolidou há décadas no plano teórico, chegue às nossas mesas;

no entanto, essa concepção padronizada de ensino e de saber que está no cerne religioso e colonialista do conhecimento ocidental teve, tem e terá muita repercução sobre a educação e o conhecimento (mesmo o tradicional) indígena;
vejo nas palavras dos índios, assim como nos documentos, a exigência ao direito de educação dos brancos, associado ao domínio da técnica num imaginário do poder;
no entanto, esse presente que prontamente (assim que exigido e por isso a impressão de vitória da educação indígena que vai se afundando cada vez mais nos níveis médio, superior e pós-gradução) é dado, é um presente de grego, um belo cavalo de tróia, que esconde dentro dele um arsenal colonialista que se acreditava, com a escola, estar combatendo;
de fato a educação circula poder na sociedade branca, mas cabe fazer uma leitura crítica disso;
para que serve aos branco e seu mercado amansar o pensamento;
estou certo de que não é para libertar o homem como propunha o iluminismo que deu origem a essa retórica da universalização da razão via educação, dando continuidade à universalização da fé da retórica judaico-cristã, que por sua vez sustentam a ordem do estado, articulado (hoje mais do que nunca em nosso hiperliberalismo mundial) à ordem econômica;

o que deveria ser problematizado é o caráter experimental que leva às educações dos brancos, pois essas são muito diversas;
certo que há uma educação do branco, mas é justamente esse bloco homogêneo que busca hoje saída na multiplicidade e na diversidade depois do estrago que deixou na de-formação das gerações anteriores, gerações incapazes de articular a teoria e a prática adequadamente;
pois a homogeneidade só se sustenta na teoria, mas a prática vive da diversidade, foi assim que, para manter a padronização (que passa certamente por nosso imaginário militar positivista) que nossa educação se teorizou irremediavelmente;
era uma diversidade muito maravilhosa de povos que devia ser homogeneizada;
essa pasteurização se deu pela educação, propagandeada como acesso único à qualquer tipo de técnica ou tecnologia;

acredito que o caminho para essa busca do experimental está no contato com outros agentes da comunidade e na auto-observação dos professores;
o professor pode ser o agente na promoção da multiplicidade se puder reverter o processo de homogeneização subjetiva que se instalou nele com a concepção de conhecimento científico ocidental;
estamos também na fase de superação de uma retórica da onipotência da conscientização e da exigência por direitos, entendendo-se por isso a servidão voluntária aos mecanismos assistencialistas do estado;
esse período pode trazer a emergência de iniciativas com outras referências, outra criatividade, outras técnicas que proliferem outros universos, universos heterogêneos ou da heterogeneidade, multiplicadores de heterogeneidade;
considero o surgimento silencioso dessas iniciativas, mais que o alarde das promessas de novos paradigmas;

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os kontanawa e o futuro da pesquisa


é preciso entender por acontecimento não uma decisão, um tratado, um reino, ou uma batalha, mas uma relação de forças que se inverte, um poder confiscado, um vocabulário retomado e voltado contra seus utilizadores, uma dominação que se enfraquece, se distende, e uma outra que faz sua entrada mascarada;
foucault, microfísica: 28

estou procurando montar e me referir a dois modelos, ou dois modos de apropriação de um modelo, um do pesquisador e outro do pesquisado;
o modelo do pesquisador fixa seus pontos no passado, a ciência tem o passado por referência, cria o futuroa partir do passado, tira o futuro do passado;
o segundo tem o passado como circunscrição, determinação, círculo e limite com o qual quer romper para fazer a história, transformar o passado e não perpetua-lo, tornar-se vítima dele nesse momento determinante do contato, dos projetos que envolvem a pesquisa e a presença do pesquisador;
o pesquisador se torna parte dessa guerra e não seu espectador passivo como o quer a teoria;
o ponto fixo do pesquisador do modelo histórico dá lugar à dinâmica que caracteriza o acontecimento;
a lógica da guerra, do acontecimento, serve melhor que o modelo histórico para acompanhar esse processo de apropriação que o pesquisado faz da pesquisa;
esse jogo de forças é apropriado pelo pesquisador quando este se desloca do probema da identidade e das regularidades próprias da retórica pseudo-científica, para enfrentar o problema dos processos de subjetivação que o pressupõem em campo como agente ativo, tirando-o da passividade própria do modelo positivista;
só então ele pode se dar conta da projeção para o futuro na qual o lança o pesquisado;
por sua própria condição o contexto emerge em torno do pesquisado;
emerge de uma perspectiva distinta daquela que o aborda e pode abordar, entre outras coisas por sua condição teórica, o pesquisador;
há uma diferença que dependerá do pesquisado superar, para que possa se apropriar dos recursos que o pequisador tem a oferecer;
na prática
a apropriação dos milton sobre o livro da mariana é um caso interessante de se detalhar, até porque ela própria já assumiu numa das postagens de seu blog o processo de subjetivação por que tem passado a mariana antropóloga;
e esse desdobramento, da subjetivação que afeta o pesquisador, é outra dimensão em que nos interessa investir mais, pois, como já me referi diversas vezes, há um grande investimento, ao longo de minha pesquisa com os guarani, na abordagem de meus processos de subjetivação;
pois bem, mariana escreveu um livro de antropologia rural cujo subtítulo publica cem anos de história nos seringais;
é notável, já no título, a proporção que o passado toma em sua abordagem etnográfica da família e do coletivo estudados;
num passado não muito distante, a pesquisadora se depara com um parentesco indígena que marca silenciosamente grande parte da família acreana, especialmente em sua porção feminina;
e por aí vai, em direção ao passado, etnografando fascinada as histórias de caboclo do patriarca e da matriarca;
o ponto culminante do livro consiste no elo que liga a família milton, propriamente dona mariana, aos seus ancestrais indígenas, quando esta conta a história de dona regina sua mãe e o episódio de sua captura por seringueiros;
o ponto mais antigo das histórias dos milton, torna-se a história seminal para a constituição de um futuro;
a história registrada, colocada no papel, assinada e documentada torna-se de passado remoto em presente e futuro urgentes;
coordenado ao movimento político interno da reserva, que não teve um desenvolvimento satisfatório, os milton encontram no livro a linha que conduzirá o futuro da família que vivenciou a aliança dos povos da floresta e conheceu o fio tênue que distingue índios de seringueiros;
a comunhão com a cultura indígena, que não foi testemunhada por tantos outros moradores da reserva, tocou fundo a vida e o destino dessa família;
a convicção da família na reserva extrativista do alto juruá é tão intensa que, não podendo modificar a realidade externa, encontraram na transformação interna o sentido e a saída para sua história de luta na construção desse espaço;
e a vantangem deste percurso não se restringe ao problema da subjetividade que vimos perseguindo, como também permite uma abordagem do problema temporal que despiste as velhas recaídas cognitivistas via esse perspectivismo todo particular;

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rizomas borgeanos


os precursores de kafka consiste num texto primoroso de borges que trata da possibilidade de um autor, no caso kafka, reinventar sua tradição ao projetar, na forma de referência à literatura de sua época/período, um campo de referências antes impensável;
segundo borges, kafka se torna o precursor de autores que haviam sido imersos, que estavam por assim dizer desativados de conexões por muito tempo, e a obra de kafka é responsável por reativar-lhes, dar-hes uma sobrevida em um "contexto" que redefine mesmo esses textos;
é assim que o presente deixa de ser imaginado como a ponta de uma linha evolucionária e passa a ser imaginado como um rizoma, um plano que guarda entre suas rugosidades as dobras em que se interconectam tempos diversos, que são um mesmo tempo de intensidades diversas, distribuídas pelo grande texto que torna indiscerníveis num mesmo plano as suas dimensões, ou seja, realidade do virtual e virtualidades do real;
ao redefinir o modelo histórico de entendimento do tempo e de suas leis via literatura, o autor (borges), como precursor de um kafka precursor da literatura fantástica e da paraliteratura, das quais é (borges) um dos avatares modernos, o autor interpõe (contrapõe, opõe etc) à essa imagem da temporalidade uma concepção que se pode imaginar como rizomática;
tanto tempo estudando e comentando o devir rizomático e ainda jazia, com o movimento e as imagens do meu pensamento, praticando os automatismos evolutivos do devir histórico e da temporalidade linear;
utilizando expressões como a influência de um autor sobre o outro, citações, as influências de um movimento sobre outro, quando os textos fazem rizoma uns aos outros, e veja que já tinham à mãos há mais de dez anos a noção de intertextualidade bakhtiniano que já sugeria há muito a necessidade de se livrar dos automatismos na prática de imaginar o tempo, sem a qual ficar-se-á preso entre as dimensões da gradação escalar;
pois arrisco mesmo, até por dever a ele essa imagem inaugural da textualidade rizomática, que a concepção de intertextualidade conforme imaginada sagazmente por bakhtin propõe teoricamente uma concepção semelhante para redefinir o universo histórico transcendental de seu tempo;
eles vão e vem, ou se dobram e interconectam, num espaço que é antes um plano que uma linha, antes dobras e conexões que constituem sua dinâmica que a direção linear geométrica, o progresso histórico ou mesmo o desenvolvimento e a evolução biológicos;

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25 setembro 2007


do caminho do criador
vai para tua solidão com o teu amor, meu irmão, e com a tua atividade criadora; e somente mais tarde a justiça te seguirá capengando;
vai para tua solidão com as minhas lágrimas, meu irmão; amo aquele que quer criar para além de si e, destarte, perece;
assim falou zaratustra;


processos de subjetivação e seus dispositivos

por isso, devem ser considerados aqui os processos de produção subjetiva postos em prática pelos coletivos, definir recursos para sua apropriação, os quais por si só já tendem a deslocar o eixo de nossas práticas pseudo-científicas, pautadas pela tradição teórica e classificatória da padronização;
um processo como o de um ressurgimento étnico é uma complexidade que não se deve reduzir a simples operador subjetivo; trata-se antes de uma matriz na qual nos deteremos para pesquisar os inúmeros operadores que a compõem;
antes de entrar em processos mais ousados de devir-animal sugiro começarmos por operadores mais simples;
vejo na ayahuasca um dispositivo interessante para análise, que pode ser considerado como inserido nesse problema matriz que seria o ressurgimento étnico;
particularmente, no entanto, prefiro deixa-la fazendo fundo em segundo plano, trazendo para o foco seus operadores;
um operador que ganhou destaque em minhas pesquisas etnológicas foi a música, via composição/inspiração, canto e dança;
assim, a matriz seria o ressurgimento étnico, na qual selecionamos um dispositivo de subjetivação que seria a ayahuasca, no qual selecionamos como operador a música;
mudanças
a abordagem tradicional valoriza o mesmo, a identidade dos grupos;
os coletivos que passam por processos de transformação foram muitas vezes chamados de aculturados, como se perdessem a sua cultura para se atrelar, serem absorvidos à margem de nossa sociedade;
essa abordagem deve se modificar quando, num primeiro momento, passa-se a valorizar positivamente a mudança, a transformação como aspecto singular da cultura estudada, como processo complexo de negociação, e não como simples perda e dissolução numa outra cultura;
após esse primeiro momento, em que a mudança modifica o olhar homogêneo do antropólogo para a observação da diferença, é a vez da manipulação com a diferença, a apropriação de sua intervenção nesses processos de subjetivação;
pois se a intervenção é inerente a esses processos, pois el se constitui de ante mão como parte do processo de contato e negociação no qual trabalham cotidianamente esses coletivos, o trabalho da pesquisa deve apropriar-se dessa intervenção a seu favor;

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meu nome é paulo;
já morei em rio branco, e gostaria de expressar minha solidariedade frente às invasões dos madereiros;
a situação é preocupante e vou informar as pessoas que eu conheço; evitem o conflito direto, mas procurem as autoridades para preservar os seus direitos;
aqui em são paulo, existem muitas pessoas preocupadas com essa questão e que poderiam gerar pressão na opinião pública, mas que não têm notícias a esse respeito;
estou reenviando para quem eu conheço e se preocupa;
mandem para o site dos grandes jornais aqui do sudeste, eu vou fazer o mesmo;
gostaria de expressar a minha solidariedade e me prontificar para ajudar no que for possível para mim;
abç

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23 setembro 2007


Aldeia Apiwtxa, 22 de setembro de 2007.

Amigos,

Saí da nossa aldeia dia 17 de setembro com outros líderes Ashaninka, Wewito, Moisés, David, Valdecir e Sooro, para ver as invasões que estão acontecendo no Igarapé Revoltoso, entre os marcos 42 e 43.

Ficamos nesse local até o dia 19 e retornamos dia 20 para a aldeia. Vimos vários caminhos usados para procurar madeira, ouvimos barulho de motoserra e muitos vestígios de caçada.

Nós não demos continuidade à nossa caminhada para evitar encontrar e evitar um conflito com os madeireiros.

Nós tivemos informações que são pequenos grupos de pessoas que são mandados por grandes empresas para tirar madeira roubada de nossa terra.

O tamanho da área que avançaram com seus caminhos deu para perceber que futuramente a destruição vai ser bem maior.

Estamos planejando uma outra ida, com mais pessoas, para destruir todos os locais e expulsar quem estiver invadindo nossa terra.

Nessa viagem ao Revoltoso, mais uma vez, deu para ver o tamanho da invasão e que já chegaram na antiga destruição feita pelos Cameli, em 1985 e 1987, já entrando em uma área que fica entre o rio Revoltoso e o rio Amoninha.

Até hoje estamos aguardando uma reunião com a SmartWood/Rainforest Alliance, que certificou com o padrão FSC a empresa Forestal Venao, principal responsável pelos desmatamentos ilegais na nossa área.

Queremos falar das invasões da empresa Forestal Venao, que vem invadindo nossa fronteira e nossa terra com máquinas pesadas, derrubando a floresta, retirando a madeira, poluindo nossos rios e igarapés.

Mas nada nos informam sobre a auditoria que a SmartWood faria no lado peruano para investigar as invasões da Forestal Venao. Nem sabemos se a vistoria já foi realizada, de que forma foi feita, qual o cronograma dos deslocamentos, os locais efetivamente visitados e os resultados.

Queremos uma resposta o mais rápido possível a respeito da vinda da equipe da SmartWood responsável pela investigação.

Exigimos ser ouvidos. Queremos uma reunião com a SmartWood, aqui na região, sobre as invasões. Queremos que vejam com os próprios olhos as áreas no Brasil da região de fronteira, dentro da terra Ashaninka, e até mesmo dentro da Reserva Extrativista do Rio Juruá, invadidas pela madeireira peruana Forestal Venao.

E, se vierem, nós mesmos podemos ir junto mostrar onde ficam e como crescem todos os dias as áreas invadidas e a nossa floresta derrubada. Podemos também chamar os amigos da Foz do Breu e da Reserva Extrativista, para que eles mesmos mostrem o estrago que a Forestal Venao vem fazendo nas áreas deles.

Queremos que a SmartWood constate por si mesma as derrubadas de madeira em Território brasileiro pela madeireira peruana Forestal Venao.

Nós sabemos que uma só visita será suficiente para que a SmartWood/Rainforest Alliance cancele imediatamente a certificação florestal que deu à empresa Forestal Venao.

Isaac PiyãkoLíderança do Povo Ashaninka do Rio Amônia

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s1ngularizações

mercado de subjetividades

cada vez mais vemos proliferar no capitalismo global recursos que estravazam os rigores da ciência para ganhar as práticas de controle social;
diante do preciosismo da academia que se torna cada vez menos eficiente em termos de propostas práticas para a operação com subjetividades, relegando-as ao terceiro setor (a extensão...), nos vemos diante de técnicas arcaicas para a padronização de categorias mais arcaicas ainda;
um mercado global se desdobra numa sociedade global, e por sua vez numa (forma de) mentalidade global;
as práticas de controle social, que têm a função justa de reforçar esse sistema global, são atribuídos os papéís de analisar, conferir, constatar os processos subjetivos, tomados objetivamente e de antemão como identidades pré-formadas ou transcendentais;

o problema dos valores

seu objetivo é classifica-los em a, b, c e assim vai, segundo um critério valorativo que escapa a esses analistas por constitui-los a eles próprios;
ao problema dos critérios valorativos das ciências do controle social foi creditada, por uma corrente iconoclasta, a paternidade da antropologia;
trata-se de um problema que traz à tona toda a problemática epistemológica, novo nome da filosofia, à ciência do século vinte;
parece que era mais fácil fazer o sol girar em torno da terra;
práticas de singularização

guattari chama a atenção para os processos de subjetivação enquanto recursos que conduzem práticas de singularização;
tomando a subjetividade como prática e não como produto ou objeto constatável e classificável todo o aparato metodológico da pesquisa se modifica;
a própria natureza da pesquisa se modifica;

a identidade da ciência

a nossa concepção de identidade - e seus correlatos - é definida em função de nossos campos explicativos pseudo-científicos;
longe de se pautar por práticas subjetivas, a pesquisa teórica se apresenta em seu corpo atrofiado por suas obssesões metodológicas e seus automatismos conceituais;
a postura arrogante da pesquisa acadêmica deve dar lugar aqui a uma outra forma de relação com a alteridade;
inicialmente, reconhece-a como alteridade para poder, então, apropriar-se de seus recursos em seu benefício;

22 setembro 2007

ecolOgia


identidade e devires

o problema que se coloca na desmontagem da identidade é um problema de implicação filosófica, diria ser o problema filosófico do grupo (e do texto do) nuti;
a busca da identidade remete a uma disposição do pensamento ocidental, ordenado em torno do ser e da identidade (conceito filosófico que, significativamente, tem sua sinonímia no conceito antropológico);
a busca por uma ontologia da relação a partir de um pensamento baseado na alteridade (ao invés da id-ent-idade) consiste em chegar numa crítica dos etnocentrismos de nosso pensamento, de nossa epsitemologia;
converter um pensamento obsecado por padrões, regularidades, cujo princípio são os sistemas de classificação aristotélicos;
assim, propor a ruptura com os pressupostos epistêmicos com que a tradição racionalista do conhecimento ocidental se dispõe equivale a propor uma ruptura com a concepção de subjetividade que essa imagem do conhecimento implica, que conduz a noção de identidade como forma-sujeito em que se pode enquadrar os devires subjetivos nas categorias pseudo-científicas forjadas para o enquadramento de outros objetos científicos apropriados à disposição em sistemas de classificação que dão sentido à racionalidade humana;
assim que em lugar do ser que conduzirá, em termos antropológicos, à identidade, propõe-se operar com a alteridade, a partir da relação como princípio;
por isso, não se trata de uma questão simples; ela possui implicações que remetem a uma postura filosófica e uma crítica epistemológica que alguns autores consideram tarefa da antropologia, considerando também que não tem sentido fazer antropologia a menos que seja para encarar tal problema;
a forma de elaborar tal problema então é problemtizar um pensamento virtual indígena que se volta para o modelo ocidental como máquina de guerra;
esse problema é tratado por guattari em três ecologias, que trata o problema na forma de um manual da operação com a subjetividade e seus recursos;
opera entre a subjetividade individual e coletiva criticando o modelo pseudo-científico tradicional, que é colocado pelo autor (1989: 28 e ss.) como instrumento do capitalismo para a redução psicológica que engendra, via mídia, em sua forma de capitalismo mundial integrado, o qual tem na produção de sígnos e subjetividades um mercado fundamental;
o que chama a atenção nesse texto são os operadores disponibilizados pelo autor para a prática das produções de subjetividade, enquanto nossos recursos discursivos pseudo-científicos cumprem sua função de reiterar as formas- sujeito nas quais está implicado, restringindo-se assim à análises, classificações e explicações de identidades já produzidas de antemão;

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21 setembro 2007

ecolo9ia

saberes da floresta

quando estava trabalhando no projeto saberes da floresta, que desenvolvi na resex chico mendes pelo cta, esses agenciamentos de enunciação tinham um percurso;
no primeiro dia trabalhava-se a noção de movimentos socias, introduzindo-se os processos de devir coletivo, de territórios existenciais que constituiam aquele coletivo;
no segundo dia, quando entrávamos nos valores que caracterizariam esse coletivo e seus devires ainda hoje, começava-se a operar com os agenciamentos de enuciação a partir da problematização dos processos comunicativos que teriam definido as ações, que constituiriam os recursos de resistência dos seringueiros de então;
essas atividades de reflexão e prática projetavam-se na forma de cartografias comunicacionais, nas quais se reconheciam os espaços comunicativos internos e externos das comunidades, em que umas comunidades conheciam as outras por seus processos sociais de comunicação;
para além dos espaços tradicionais, tais como escolas, igrejas e sindicatos, foram identificados e ampliada a noção de espaço comunicacional, abrangendo diversos espaços de produção de subjetividades;
a música é um espaço de comunicação de grande importância; o grupo de jovens mostrou-se também como iniciativa de expressão;
todos eles foram identificados como espaços privilegiados à ação do agente florestal enquanto comunicador, formador de opinião e líder; o caráter técnico do trabalho ganhou sua dimensão humana e política de produção subjetiva;
quando se retomou as ocorrências históricas (tópico 1: movimentos sociais) para projeta-las em possíveis regimes de valor diferenciantes que marcassem sua especificidade (tópico 2: ética do manejo) tal projeção já foi feita tendo em vista os saberes da floresta que marcam a pesquisa (tópico 3: pesquisa dos saberes da floresta);

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19 setembro 2007

ecolo8ia


agenciamentos de enunciação

dado que tal influência da pesquisa na constituição das subjetividades dos monitores e outros extrativistas não só é um fato facilmente constatável, mas que já foi mesmo apropriada convenientemente pelo projeto de pesquisa (claro que de acordo com sua abordagem e concepção de subjetividade) por que não apropriar-se desse devir-pesquisador como um princípio deste projeto, que objetiva tocar esses processos de subjetivação;

a pesquisa pode ser uma das bases de formação de subjetividade apropriada; ela pode suscitar uma diversidade de intervenções em processos de produção de subjetividades;
com isso aliamos, sem abandonar, a pseudo neutralidade da pesquisa na reserva, que acreditava não intervir nos modos de ser dos monitores, e propõe intervenções e interferências subjetivas como prática de pesquisa;

essas intervenções têm como critério de análise seu caráter ético-estético, conforme propõe guattari (1989: 18)para a abordagem de processos de subjetivação;

podem ser oficina de projetos, concurso de fotografia, produção de vídeos, livro de poesias etc, desde que não se trate de entrar, perguntar, observar, anotar e ir embora;
podem ser ainda processos de subjetivação voltados para os recursos locais, tais como talhe em madeira, machetaria, artesanatos, oficinas de teatro, música e pintura etc;

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eco7ogia

centro de saberes da floresta

é nesse sentido que podemos nos apropriar do caráter vivencial/existencial do yorenka ãtame;
sua natureza de projeção existencial, com seu caráter de formação, opera com a manipulação e produção de subjetividades;
a proposta que norteia o projeto é direcionar-se aos valores próprios à realidade local, a processos de subjetivação pautados nos modos de vida proporcionado pelas riquezas locais;
além desse princípio, ainda que inerente e simétrico a ele, um outro ponto de afinidade é a crítica ao modelo homogeneizante típico das práticas associadas ao capitalismo, à formação exclusivamente para o mercado, às políticas generalizantes de educação do estado;

em contraste com as políticas de homogeneização, características do capitalismo mundial integrado e assumidas pelo governo com seus índices de desenvolvimento e administração, o centro, a começar por sua própria proposta, se coloca no campo experimental das singularidades, como laboratório de subjetividades;

a busca por novas formas de relação de conhecimento que desloquem a hierarquia professor-aluno, o investimento no intercâmbio de saberes inspirado nas práticas comunicativas cultivadas na aldeia;
tais princípios dão forma aos agenciamentos de enunciação, esses suportes expressivos experimentais que vão dando lugar a formas de relação igualmente experimentais;
nesse complexo se articulam os processos de subjetivação em que pretendemos tomar parte para dar notícia;

não possui o centro a natureza esquiva da pesquisa;
sua natureza, ao invés disso, é a de usina de agenciamentos de enunciação a constituirem sempre novas subjetividades alternativas e singulares a partir do intercâmbio de saberes;

nesse sentido, o centro tem um papel social claro: constituir-se numa abertura para a busca criativa de subjetividades singulares, em contraste com os processos de subjetivação locais, pautados em universos de valor marcados pela homogeneização capitalista e o monismo estatal;

18 setembro 2007

ecol6gias

territórios existenciais
enfim, por que cito os agenciamentos e projeto ações: por que a instauração de territórios existenciais por parte da pesquisa na reserva sempre foi imperativa;
os cadernos, a escrita, a intelectualidade passaram a pautar processos de subjetivação em toda a reserva e, mais intensamente, naqueles que tinham contato imediato com a pesquisa;
quantas boas vezes já não ouvi a experiência de seu milton, quando mariana lhe deu um estímulo fundamental à leitura com a ajuda do hinário o cruzeiro;
ou mesmo a experiência seminal de roxo pedindo ao seu mauro para introduzir-lhe à pesquisa, pois queria ser um pesquisador;
os cadernos, a escrita, a intelectualidade passam a marcar o desenvolvimento da subjetividade de personalidades de destaque no grupo da reserva tais como roxo, seu caboré, joão gonzaga entre outros;
cada qual singular em seu processo, todos marcados por agenciamentos de enunciação definidos: roxo com a pesquisa, seu caboré nos versos, joão gonzaga na música etc todos processos relacionados mais ou menos diretamente aos intelectuais/pesquisadores;
eles definem padrões, territórios existenciais, devires que são determinados pela presença e convívio com os pesquisadores em suas estadas na reserva;
isso se delineia mesmo, ou principalmente, naqueles que acreditam terem deixado a sua chance passar, que não se viram destacar nesse universo de regras, nesse território existencial, em seu discurso de ressentimento;
no entanto, seja nesses ou naqueles, o que se vê é um imperativo da intelectualidade que se manifesta na importância que atribuem à educação escolar dos filhos, que se torna hoje a questão mais importante em termos de critério na definição pelo melhor lugar para se instalar na reserva: próximo a uma escola;

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ecologia5
os monitores e seus diários

o interessante é que esses agenciamentos possam estar cada vez mais em domínio dos monitores, que eles se apropriem como se apropriaram (e até se tornaram vítimas) dos diários e seus recursos, chegando a criar novas categorias de diários, com certo domínio técnico, que diferencia novatos de veteranos;
o que pode ser destacado aqui são os processos de apropriação dos cadernos e seu recursos por parte dos monitores, como recriaram os cadernos, como fizeram dos cadernos trampolins de subjetivação etc, todas aquelas boas histórias que ficavam sem lugar na análise de identidades e outras regularidades;
o que interessa é menos o sucesso egóico dos cadernos ou a prova de que servem para o acúmulo de mais informações sobre os nativos e sua vida, que os processos de subjetivação como objeto de nosso estudo;
lidar com esses processos dedobrando-os e aproveitando seu rendimento;
deslocar com esse trabalho a fixidez sobre a identidade, apontar outros rumos interpretativos, orientados por outras balizas teóricas e epistêmicas;


sbpc

todo o trabalho realizado na sbpc teve como agenciamento e enunciação a avaliação da reserva com os recursos de que dispunham;
produziram análises, foram feitas fotos e desenhos, danças e plantação de árvores;
quem se apropriou desse material em termos de agenciamento de enunciação foram os pesquisadores que apresentaram sua avaliação a partir da avaliação dos monitores;
no entanto, o objetivo inicial da avaliação era outro;
o que foi colocado como objetivo da avaliação seria uma burocrática apresentação dos dados ao governador para que ele tomasse providências e considerasse a categoria dos monitores como representativa na reserva;

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17 setembro 2007

eco4logias

o problema epistêmico

esse deslocamento da tradicional identidade para os processos de subjetivação pode parecer simples, mas ele só é possibilitado por, ou melhor, resulta de uma crítica radical da filosofia ocidental ou do regime de verdade dessa matriz epistêmica;
a tradição da filosofia ocidental remete à identidade pelo pensamento do ser, que a caracteriza, e por sua contínua reapropriação, ao longo dessa história, do modelo positivo de explicação do mundo, do homem e da linguagem;
os sistemas de classificação formulam e fornecem o paradigma positivo do pensamento ocidental, cuja função de conhecer, dominar e intensificar poder destaca a ciência como aparelho de estado de primeira ordem;
fornecem igualmente o padrão da subjetividade pelo modelo positivo do ser e das essências, que se opõem às aparências para explicarem a transformação, estranho processo entre o ser e o não-ser que desafia o positivismo original;
a imposição desse modelo positivo se sustenta sobre uma concepção específica da linguagem, em que esta é tomada como modelo de representação das coisas do mundo e dos homens;

o problema epistêmico da subjetividade

essa crítica epistemológica, não poderia ser diferente, vem acompanhada de uma revolução na abordagem da subjetividade ou, simplesmente, consiste em sua abordagem, visto que a subjetividade não era um problema desenvolvido na pesquisa acompanhado da devida crítica dos pressupostos que a sustentavam;
o tema seria antes desenvolvido em termos restritos de identidades e outras substancializações que transformam em objeto os processo de subjetivação;
a proposta, portanto, consiste em praticar essa crítica às formas da subjetividade pressupostas no trato antropológico com a identidade;
essa prática crítica se direciona à apropriação de processos de subjetivação imperceptíveis à concepção teórica e ao modelo metodológico característico da antropologia tradicional;
portanto, é capital a essa abordagem o estudo e apropriação das praxis que conduzem processos de subjetivação;

para apoiar teoricamente essa conversão, propõe-se a articulação com outros grupos que investem em reformulações teóricas e abordagens críticas da antropologia brasileira do século vinte;

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ecologias 3

a ecologia como ciência

para dar status de ciência à ecologia e se apropriar de suas práticas, deve-se então extrair-lhe o caráter humano e político que lhe deu projeção como máquina anti-capitalista;
acontece que, com isso e por isso, se dissipam todos os processos de seu campo de ação, principalmente os subjetivos que aqui nos interessam tanto, fazendo-se dela uma prática estéril;
ao invés disso, queremos investir sobre as práticas de subjetivação que tiveram lugar com a emergência da ecologia, criticando e despistando seus diversos processos de apropriação por parte dos aparelhos de estado e das formações de poder capitalísticas, que se apropriam desses modos de subjetivação para controlá-los e neutralizá-los;

enquanto a ciência insiste em pautar-se por princípios de neutralidade, a qual formula apagando-se do campo perceptivo para extrair todo o sentido do objeto, a ecologia se define como ciência de intervenção;
intervenção nos efeitos do capitalismo, da ação desse homem e dessa ordem social sobre o seu meio e o meio de outras subjetividades, às quais o capitalismo é identificado como antípoda, tais como indígenas, animais, plantas e outras formas da vida selvagem que resistem a ele com sua heterogeneidade;
ecologia e subjetivação

não é a concepção de equilíbrio mas as de auto-regulação, auto-gestão e, principalmente de auto-poiesis que vigoram na noção de ecologia aqui formulada;
a noção de natureza não consiste na natureza intocada dos preservacionistas, mas a da natureza como um processo de intervenção contínua do homem, com a diferença que não se tem o extermínio e o desenvolvimento predatório como horizonte, como o tem o capitalismo;
é assim que se possibilita pensar o complexo ecológico como matriz para a elaboração de formas de subjetivação que configuram um projeto de resistência ao capitalismo inclusive nessas esferas;

13 setembro 2007

ecologias 2
o problema da natureza

dos problemas que assombram essa origem de ruptura e resistência da ecologia, o da concepção de natureza consiste num dos mais complexos por seus desdobramentos epistêmicos ou filosóficos;
o problema da concepção de natureza situa-se no princípio que orientará o posicionamento epistêmico da ecologia;
tomando o rumo da velha tradição metafísica e positivista, a noção de natureza se refere ao par opositivo da noção de humanidade;
rompendo com essa tradição, opera-se nos insterstícios dessas noções, com a humanidade da natureza e a natureza na humanidade;
a matriz epistemológica ocidental, que pretende circunscrever a ecologia como ciência biológica, esvazinado-a de sua função de movimento social e prática subjetiva, constituiu-se a partir do universo de valores próprio ao capitalismo;
dessa forma, o que põe a perder a ecologia, fazendo dela uma ciência biológica do equilíbrio natural em favor da tecnocracia, consiste na concepção de natureza que dá sentido ao sistema valorativo ocidental, incluindo sua mitologia, e à ciência decorrente dele, incluindo igualmente sua mitologia;
segundo essa concepção, que opõe a humanidade ao natural, a natureza é desprovida de seu caráter humano, inclusive do caráter político que deu projeção à ecologia;
por isso, não se trata de equilíbrio ecológico como questão de ordem burocrática ou tecnocrática, mas da ecologia como um processo que articula as esferas do humano e do não-humano na constituição de subjetividades não-capitalísticas;
pra que serve a ecologia?

a ecologia não é uma questão estrita de equilíbrio na ordem natural, seu problema não se restringe a isso;
ela envolve uma série de processos, projetando-se como paradigma de resistência ao capitalismo como movimento integrado globalmente;
trata-se, inclusive, de ir além de afirmar a dimensão humanista da ecologia, em contraste com sua concepção tecnicista, tecnocrática ou naturalizante;
trata-se mesmo, de se utilizar da ecologia como paradigma à reformulação dos princípios de ação e pesquisa ancorados pelos círculos viciosos das orientações pseudo-científicas da ciência pela ciência;trata-se de operar no horizonte das práticas de subjetivação próprias às máquinas de guerra, em lugar das 'rigorosas' explicações científicas a serviço dos aparelhos de estado;

10 setembro 2007



ecologias

guattari fala dos processos imanentes de trabalho sobre a subjetividade e sua produção;
em lugar da análise pseudocientífica em busca de explicações e regularidades sem muito objetivo a não ser a explicação pela explicação da ciência pela ciência, investir na operação com os recursos de produção de subjetividade a partir dos agenciamentos de enunciação: diários, encontros de formação, debates, visitas domiciliares, meios de comunicação tais como rádio, blogs, produção de textos, artigos, exposição de fotos, produção de filmes e vídeos;
transformações

a perspectiva em que queremos investir é a da crítica à ordem de valores, atribuída na pesquisa antropológica, aos processos de subjetivação;
essa perspectiva equivale a uma inversão, já que até então o que se valorizou positivamente eram a suposta originalidade e as regularidades constatáveis e quantificáveis nos procedimentos metodológicos pseudo-científicos;
essa inversão refere-se, portanto, ao fato de procurarmos aqui elaborar procedimentos que valorem positivamente também a transformação, especialmente as transformações que resultem de processos de subjetivação, de apropriação e construção de subjetividades;
em lugar dos objetivos pseudo-científicos de explicação pela explicação, conhecimento pelo conhecimento, busca-se a apropriação dos dispositivos de subjetivação como praxis de resistência a serem investidas;
em lugar da neutralidade científica, responsável pela concepção de subjetividade aqui criticada, uma análise crítica dos dispositivos subjetivos do capitalismo que vise um investimento sobre as práticas de subjetivação norteadas por princípios
ecológicos;
por que a ecologia?

devido à ecologia ter se constituído enquanto prática (e não ciência) de inegável dimensão política e, principalmente, por sua orientação anti-capitalista é que ela se torna em paradigma para nosso modelo valorativo;
seja por sua configuração como prática de resistência ao capitalismo integrado, seja como forma de atividade anti-cientista, que abole e critica a retórica da neutralidade constitutiva do modelo valorativo da ciência oficial, a ecologia servirá de paradigma aos processos de formação subjetiva aqui projetados e empreendidos;
enquanto a pseudo-neutralidade científica serve de retórica à sua apropriação como aparelho de Estado, a ecologia ainda que apropriada igualmente ao aparelho de Estado, guarda uma potencialidade anti-capitalista nada neutra;
à falta de direção da 'ciência pela ciência' e seus princípios e recursos pseudo-científicos que redundam em sua forma própria de homogeneização subjetiva, a ecologia opõem um norte anti-capitalista definido, pautado em práticas de subjetivação heterogênea;


zaratustra
valores às coisas conferiu o homem, primeiro, para conservar-se - criou, primeiro, o sentido das coisas, um sentido humano! por isso ele se chama 'homem', isto é: aquele que avalia;
avaliar é criar: escutai-o, ó criadores! o próprio avliar constitui o grande valor e a preciosidade das coisas avaliadas;
somente há valor graças à avaliação; e, sem a avaliação, seria vazia a noz da existência; escutai-o ó criadores!
mudança de valores - é mudança de criadores; sempre destrói, aquele que deverá ser um criador;
criadores foram, primeiro, os povos, e só mais tarde, os indivíduos; na verdade, o próprio indivíduo ainda é a mais jovem criação;

06 setembro 2007



duas pelo sete de setembro

para quem ainda tivesse qualquer dúvida – afinal o discurso ecológico era uma mercadoria de primeira na ordem capitalista e em seu mercado global emergente – a aliança dos povos da floresta esclareceu: as reservas extrativistas eram máquinas de guerra;
como máquina de guerra, propunha-se passar do sistema patronal e coronelesco da exploração predatória direto para um outro imaginado (por quem? pelos seus idealizadores, pelos seringueiros politizados!) da sustentabilidade anti-capitalista;
e foi justamente aí que se deu o conflito (se houve conflito) a partir do qual o governo ou estado, no caso do baixo acre, tomou de assalto o projeto das mãos dos ex-seringueiros com sua proposta de manejo madeireiro;
aí: onde a máquina de guerra pôde se confundir com o discurso ecológico;
um produto aqueceu a economia global no final dos oitenta: o discurso ecológico;
esse produto caracterizou a emergência de um mercado de discursos que será uma das maiores indústrias do novo milênio com a internet e seus novos paradigmas comunicacionais;
além disso, modelou toda uma política de caráter neoliberal voltada para o terceiro setor;
nas décadas seguintes, esse discurso ecológico iria movimentar milhões de dólares e ludibriar o discurso politicamente (e ecologicamente) correto que se tornaria um produto igualmente poderoso no mercado de discursos;
esse discurso ecológico era o outro à espreita da máquina de guerra, criou-a e a devorou;
talvez a máquina de guerra nunca tenha existido, ainda que muitos a tenham vislumbrado, e esteve sempre sob controle;
pingo geralmente se refere a como ficou pasmo com a fragilidade da direita diante do movimento atrapalhado da esquerda e suas conquistas;
a fragilidade do movimento popular e seringueiro resultou em monstros que a direita sozinha não criaria;
ainda hoje, encontram-se resquícios da concepção que sustentava o discurso da suposta máquina de guerra (que foi engolida pelo ecologismo);
o que me chama a atenção nesse discurso é algo que já não faz sentido mas continua a se afirmar;
trata-se do imperativo moral que fundamenta o discurso, imperativo moral que leva à confusão dessa máquina de guerra e conduz seus construtores a se unirem com o antípoda da máquina que construíram, imaginando-o decerto muito diferente do patrão que tinham;
em seu discurso tudo deve ser, tem que ser, é o certo, é a lei etc... gritam em sua impotência, tudo sempre advindo de um poder externo;

nesse sentido, ainda que usemos nosso aparato moral e nosso jornalismo policialesco marrom para amaldiçoar orleirzinho, pois o narcotráfico na base, principalmente onde a moral de estado não impera, é uma economia como outra qualquer, desprovida desse caráter bestial que só nosso moralismo provinciano é capaz de produzir, pode-se pensar que o presidente vitalício da asareaje manteve-se fiel ao seu projeto anti-estatal/anti-governamental;
o que pode ser confirmado inclusive pelo conformismo em torno de sua prisão, pelo silêncio, ou melhor, pela falta de indignação moral e estatal das pessoas aqui no juruá;

***

até em respeito à tradição, tradição essa que não precisam conhecer ou mesmo já conhecem sem saber, muito de nossos lentes universitários acredita, desmedida, tratando de assuntos científicos, na força da convicção;
credita-se a isso uma série de fatores que vão desde a posição que os referidos lentes são convocados a serem guardiões, são os guardiões das ciências e das letras, pela sociedade, uma espécie de tradição, até (para manter a velha ordem social/individual) ao modelo de subjetividade com que forjam suas personalidades a partir das suas experiências com o conhecimento, com o social etc...
a dúvida não é uma prática comum em nossos professadores, a verdade sim;
essa verdade é sobre o que quero falar, pois há algo nela que não me permite ficar muito tempo em suas palestras, o que me resta debater sozinho aqui;
o ponto para mim, e constato isso passando o olho em minhas anotações sobre o pouco que pude ouvi-los, é o moralismo a que eles se permitem nessas terras que julgam recém civilizadas, ou melhor, em processo de civilização no qual, aliás eles cumprem seu protagonismo;
que verdade moral trazem esses civilizadores aos selvagens?
geralmente os vejo falando sobre o respeito à diversidade, tema fácil promovido pelo governo da pseudo-diversidade, igualdade para usar seu termo, a qual deveria ser respeitada, segundo eles;
um dia vi um estudante mandar esta: mas sairia muito caro implementar esses dispositivos de garantia da diversidade, não teria qualquer retorno;
o professor estarrecido, talvez por que, depois de horas de fala, pensava ter convencido a todos, mas já o primeiro a falar mostrava que não;
é uma pena que tenha poucos argumentos para arrolar sobre esses moralistas, pois não tenho estômago para ouvi-los por mais de poucos minutos, ainda mais quando começam com seu catecismo de deveres;
no entanto, me propus a escrever sobre sua concepção moral de verdade ou da verdade moral;
lembro de passagem que no brasil da ordem e do progresso foi o único lugar que vingou a religião positivista com direito a igreja, altar e santa;
e quando debatíamos isso na sala da pós em ciências políticas ainda comentei ironicamente, só podia ser mesmo no Brasil..., ao que uma das professoras respondeu, ...que gosta tanto de religião..., ao que eu cortei, ...que gosta tanto do positivismo...
retorno à nossa concepção moral da verdade...
traçando uma caricatura grotesca de genealogia, remeto-os aos princípios humanistas do iluminismo, sob o qual disfarçam seu moralismo religioso;
o humanismo racionalista é o dogma da religião científica;
é sobre ele que estão assentados os princípios desses missionários da ciência positiva que deve esquadrinhar e explicar o mundo segundo a tradição das subdivisões aristotélicas;
é em nome da missão socrática da democracia racional, melhor seria república racional, que atuam nossos cavaleiros da fé;
a missão é católica, ou seja, universal;
como na outra religião, é certo encontrar nessa outra mitologia um povo ou um grupo de escolhidos;
o dogma consiste em que o que nos reduz é a razão;
o espírito, que define o ser humano, é uno com a razão, a mesma essência, e a sua cruzada consiste em construir um mundo igualitário a partir dos princípios racionais;
a máquina de convencer deixa de ser a velha e tradicional violência do sistema de crueldade e passa a ser a razão, para a qual todos deverão ser, por lei, democraticamente treinados;
o instrumento da razão é a escrita, a escrita é instituída como mídia universal;
mídia essa que se define por ser a mídia das leis, das leges, das leituras, da materialização e onipresença da ordem (atente-se à polissemia da palavra) e da violência do proto-estado;
o nomadismo da voz passa a ser inscrito na pele para se gravar e fixar na memória e no espaço;



não posso conceber uma antropologia sem filosofia;
a antropologia tanto quanto a filosofia estão baseadas em teorias do conhecimento;
talvez a antropologia (não passe de) seja um capítulo da filosofia (o pensamento selvagem não atesta isso..., deleuze já não afirmou isso em anti-édipo...);
em minha prática de pensamento, ambas se articularam em propósitos definidos: fazer do pensamento um jogo, uma prática e um exercício de se desvincular da concepção de verdade explicativa do positivismo, desautomatizar o pensamento e a forma-sujeito que ele implica utilizando-se desse intercessor que é o pensamento outro;
pois isso só se faria compreendendo minimamente do que se trata o pensar ocidental, quais as formas que a filosofia utilizou para se desdobrar, para refletir o pensamento em seus princípios e pressupostos;
as formas do rebanho e as maneiras de lidar com ele, de moldar-lhe o pensamento: afinal, não há psicologia senão a do padre...
portanto, para desconstruir o meu sujeito devo articula-lo com minha dimensão de sujeito de conhecimento;
inicialmente para romper essa unidade inicial em que me confundo com o pensamento;
essa ruptura se dá com a multiplicidade do devires que definem o pensamento;
é isso! pois fora essa a invenção de sócrates, essa consciência racional, essa identidade do sujeito com a razão, com o pensamento;
nisso ele foi predestinado, na confecção desse modelo de subjetividade que ainda hoje no engana;
por isso o jogo, a multiplicidade, contra essa unidade essencial;

***

incita-me que a moral seja uma grande incógnita seja para a antropologia, a filosofia, ou os pontos em que elas se articulam;
a ordem moral é um poderoso instrumento do discurso religioso de nossa civilização;
é um elemento central para uma história da verdade que proponha qualquer continuidade entre a verdade religiosa e a científica;

qualquer questão a ser colocada pela antropologia deve partir de uma perspectiva epistêmica, deve lidar com o confronto de pensamentos diversos;
quando se parte de um horizonte de pensamento homogêneo, não problemático, já se fez a redução, já se colocou a serviço o arsenal da moral civilizatória e colonizadora;

o confronto desses pensamentos tem o mérito de desestabilizar um campo para verdades, um horizonte positivo que possa afirmar verdades sobre o outro e seu pensamento, dado que o outro também tem seu campo de relativas verdades;

acontece que o pensamento conflituoso dessa antropologia não poderia tornar-se unânime, havendo ainda muito espaço ainda para o positivismo;
essa antropologia do pensamento selvagem segue como resistência, como proposta de reformulação dos princípios do pensamento ocidental via crítica da representação e crítica dos regimes sígnicos;

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