22 dezembro 2005

SABERES

Em relação ao referencial teórico do Perspectivismo amazônico, o ponto apresentado refere-se à proposta fundamental de desenhar dois modelos de produção de conhecimento/saber, com o objetivo de coloca-los ombro a ombro, comparando-os segundo as especificidades de seus próprios termos.
A sobreposição da ciência ocidental em relação aos demais sistemas de produção de conhecimento tem fundamento, sobretudo, místicos ou religiosos. Tais fundamentos desdobram-se em políticos (bélicos) e ainda históricos (histórias colônia e metrópole), entre outros. São esses fundamentos, seguindo esta ordenação, que encaminham o etnocentrismo do homem ocidental e também o de sua ciência, sendo este último eivado de teor epistêmico, ou seja, em sua devida dimensão epistêmica.
Nós, cidadãos ocidentais estamos dogmaticamente convencidos de que a nossa ciência é superior às demais. Qual é a nossa e quais são as demais podemos nem saber, mas estamos certos de que a nossa é a melhor.
Esse valor opera sob a concepção de que existe uma unidade que nos permite comparar em tais termos ao invés de, segundo o princípio da diversidade/multiplicidade, buscar as equivalências que nos permitam comparar esses sistemas de saber.
Por isso, afirmou-se acima, o fundamento místico como o primordial na cadeia que ordenará os fundamentos do etnocentrismo da ciência ocidental. A concepção da unidade é o princípio místico fundamental do pensamento ocidental. Em relação à mitologia plural de nossos antepassados, o judaísmo afirma a unidade anti-mítica.
É bastante similar a forma com que a religiosidade judaico-cristã se refere às heresias mitológicas da maneira com que a ciência ocidental se refere aos demais sistemas de saber.
Essa unidade que submete os demais sistemas de saber e pesquisa aos nossos valores está associada à unidade do poder político que se busca estabelecer sobre este território desde que os primeiros europeus pisaram na terra brasilis. Desde então o que se viu foi a redução de um sem número de mundos que aqui se encontravam no discurso de uma única nação, de um poder unificado e centralizado.
Que se entenda nosso rumo: não é a diversidade/multiplicidade política que deverá garantir e legitimar esse saber ( tradicional ou outro em relação ao da sociedade central que tem o externo por referência). O que se propõe aqui é que o saber, o investimento na pluralidade dos saberes pode proporcionar a heterogeneidade política.
Nós, cidadão brasileiros, somos doutrinados em nossa formação a falar institucionalmente, em nome dessa unidade para prosseguir o exercício da submissão da diversidade de brasis pelo brasil homogêneo, o qual só existe idealmente e para servir a uma antiga oligarquia que deu ao mundo tal discurso da homogeneidade. Frisa-se aqui que este discurso de homogeneidade busca submeter à terra e ao povo que simboliza a multiplicidade global. O que se evidencia assim, é que se encontra aqui a grande potência capaz de fazer frente às armas homogeneizantes da globalização.
Tal multiplicidade, que tantas ameaças traz aos discursos e práticas políticas que se sucederam nos últimos 5 séculos (e que formam as sucessivas gerações de brasileiros), é proposta aqui como a marca fundamental das culturas brasileiras, bem como riqueza fundamental a ser exportada para o mundo da homogeneidade globalizada que nos ameaça, assim como ameaça a todo o planeta.
A partir disso, justificaríamos nossa proposta de trabalho. Esta proposta tem por princípio investir numa concepção de pesquisa e produção de saber que priorize métodos originais, próprios desse saber.
Propõe-se, assim, buscar no próprio modelo de produção de saber dos florestãos tais processos de organização de saber.A ressalva que deve ser feita: o que se propõe não é abrir mão dos recursos e instrumentos disponibilizados pela tecnologia de nossas sociedades complexas. O que se propõe sim é se utilizar de tais recursos e tecnologias de forma crítica e politicamente consciente, visto que o poder que elas concedem tende a reproduzir a homogeneidade e que o que se busca aqui é afirmar a multiplicidade, ou seja, o saber florestão.

06 dezembro 2005

umantropologia

Se vocês me perguntassem o que estudo eu, responderia de chofre: estudo antropologia, ou seja, aquilo que as pessoas sabem/fazem e não sabem que sabem/fazem. E vocês revidariam: e pra quê se estuda isso? E eu: bom, entre as coisas que sabemos/fazemos e não sabemos que sabemos/fazemos existem dois tipos de coisas.
As primeiras são as coisas que sabemos/fazemos e são boas para nós. É importante conhecermos essas para aperfeiçoá-las.
As segundas, vocês devem imaginar, são aquelas coisas que sabemos/fazemos e não são boas para nós. A importância de conhecermos como nós próprios nos prejudicamos está em podermos neutralizar tais impulsos prejudiciais a nós mesmos.
E vocês poderiam me questionar: mas essa sua antropologia está parecendo religião com essa história de certo e errado. E eu: é justo, principalmente se ao tomarmos consciência de tais forças, as primeiras e as segundas, temos por hábito identificar as segundas como provenientes de forças externas a nós próprios que teriam interesse em nossa alienação: o mal, que poderia ter outros nomes tais como o capitalismo, o sistema, a repressão, a igreja etc.
O que se quer aqui não é radicalizar dizendo que tais forças não existem. O que gostaria é de relativizar tal discurso negativista ou crítico, propondo que existe uma contraparte, um princípio da servidão voluntária que atua como força interativa.