31 agosto 2006

o discurso monoteísta se define então como o discurso do poder por excelência;
há alguns anos levantei a questão, na busca de definir os meios da aprendizagem indígena; para além da escrita não haveria educação indígena, qual o lugar do canto e da dança nesse processo de aprendizagem do jovem indígena, como situar epistemologicamente esse problema, como reconstituir sua genealogia;
o corpo como superfície de inscrição de códigos, a materialidade do pensamento, a ruptura com uma homogeneização que atravessa o catecismo cristão dos jesuítas e o discurso racista das ciências, que toma o branco e seu pensamento por modelo, em sua vontade de verdade que reproduz um mundo sob a imagem unitária da convergência, em que tudo converge para a visão de um mundo pré-definido como o verdadeiro;
a liberdade para criar novos mundos, para se desvencilhar de toda de toa velha carcaça de verdades pesadas, aprendendo os códigos para manipula-los de acordo com tal liberdade; enfim, uma liberdade de quem e para quem a história não faz o sentido obrigatório que faz para nós, sentido linear e, sobretudo, evolutivo;
os indígenas, com as secretarias de estado ou câmeras de filmagem nas mãos, nos provam que nossa história pode evoluir para trás, para os lado, em outras direções, mas sobretudo que para além dela podem surgir outros mundos, criados mesmo por outros enfoques, outras naturezas humanas, diferentes aquelas que criaram o monoteísmo e a história;
define-se, portanto, neste ponto de inflexão a natureza comum do discurso religioso, do discurso histórico e do científico;
a morte de deus pode ser pensada como um problema discursivo; visando lançar luz mais sobre o problema do discurso do que nas propriedades divinas, gostaria de pensar o tema filosófico da morte de deus como um efeito da problematização do discurso;
perceber a espessura do discurso, o que rompe com a natural transparência da dinâmica da representação, é o problema ou ponto de inflexão a partir do qual não se pode retroceder;
a natureza discursiva, depois de se dar a conhecer, ameaça devorar, desmoronar o mundo constituído pela linguagem da representação;
reconhecer a ordem do discurso depois de tantos séculos de vigência do discurso da ordem, da ordem da representação, requer uma reformulação no conjunto das referências do pensamento;
por isso, uma questão que se coloca em derrida é como criticar um discurso, no caso, a metafísica, utilizando os próprios termos que a reproduzem;

a linguagem na produção de conhecimento
o objetivo de problematizar esse tema é considerar novamente a natureza de processo da aprendizagem que se perde no discurso objetivo de nossas disciplinas que tornam seus objetos em objetos estáticos;
a linguagem e os conceitos são considerados como objetos estáticos, daí começa o problema, que tenderá a reprodução de um mundo em que o processo é alijado;
operar com a linguagem respeitando a natureza de processo dos devires requer que reconheçamos e dominemos a arte do devir na linguagem, em que a linguagem antes de qualquer vontade de representação, simule e queira simular em seu corpo o processo com o qual entra em simbiose;
este método da implicação é em que estamos trabalhando há séculos para constituir possibilidades de saída do universo da convergência, saída para referências outras;
a possibilidade de operar com a dinâmica do sentido nos libera para o puro devir; rompe-se com unidades pré-estabelecidas, a vontade de verdade é evidenciada como processo de reafirmação de antigas referências voltadas para o processo de representação, no qual a linguagem transparente refere-se a algo que está para além dela, sendo representado por ela, reduzindo dessa forma o seu caráter produtor ou reprodutor no processo de que participa;
sem esta quebra epistemológica não é possível referir-se – que dirá apreender em linguagem – as propostas de trabalho dos professores indígenas;
sem definir referências outras nesse universo dos pensamentos das diferentes culturas, não é possível apreender o que as experiência em produção de conhecimento dos professores indígenas significam, ou o campo de significados que elas criam;
para tanto, é necessária uma crítica da linguagem que nos prepare para penetrar em tal campo, uma crítica que situe o código verbal nas especificidades deste plano epistêmico/epistemológico;
tal crítica deve evitar parte das refrações em que somos pegos pelas miragens resultantes de nosso discurso científico embebido de homogeneidade, vontade de verdade e tendendo á convergência, naturalizando-a;
situar-se no plano da linguagem, aqui, é uma conquista que permite desmontar diversas armadilhas;

Há muito o tema da educação indígena no estado do Acre deixou de ser um tema específico de estudo. Sua projeção já tornou este tema uma matriz, um ponto de acesso a uma gama de possibilidades e estudo: a atual organização das comunidades, as políticas públicas para os povos indígenas, a gestão dos conhecimentos tradicionais, as práticas de comunicação, a produção de livros, discos e filmes, as ações dos agentes florestais indígenas, as pesquisas desenvolvidas por indígenas ou em parceria com os povos indígenas, o processo de gestão dos recursos naturais;
A especificidade desta delimitação é menos de tema que conceitual e metodológica. Opta-se aqui por trabalhar com a produção de conhecimentos. Com isso, instala-se uma perspectiva marcada pela metadiscursividade, quando o texto não perde de vista o lugar que ocupa e não perde seu enfoque numa transparência etnocêntrica.
A neutralidade, tomada antes como virtude da antropologia, pode comprometer um tema como este que temos em mãos. Sua consciência discursiva ordena um comentário que forneça uma instância em que o processo se dobre sobre si mesmo, demonstrando sua consciência lingüística.
Em resumo, o trabalho elaborado pelos professores indígenas é material etnológico por excelência, por que está consciente o tempo todo da linguagem utilizada na produção do conhecimento.
Tal característica, que parece tão simples, só encontra par em nosso conhecimento na antropologia, pois nossa ciência, obedecendo sua tradição metafísica, se caracteriza justamente, pela busca da neutralidade, da transparência da linguagem, prevalecendo o referente numa abordagem objetiva.

A natureza do tema possui similaridade com a natureza do texto. Também o texto-comentário se apresenta como produção de conhecimento.
O termo produção de conhecimento busca dar conta tanto do caráter processual do objeto/tema, como do protagonismo dos professores indígenas, característico da educação indígena no Acre.
Buscaremos assim, por razões metodológicas, evidenciar e problematizar em termos antropológicos, esse protagonismo que marca desde o processo de formação dos professores indígenas, de responsabilidade da CPI, até os trabalhos desenvolvidos pela OPIAC.
Os problemas discursivos, do jogo de vozes, da autoria coletiva e da pesquisa com fontes orais, as questões do regime enunciativo, que fala para quem, em que situação, quais os discursos dentro do discurso, histórias e mitos contados nas narrativas orais.
Operar com estes platôs, com tais dimensões discursivas, requer resoluções narrativas que são antigos problemas da antropologia. Como tratar a palavra do outro na pesquisa é um antigo problema antropológico.

Operar com discursos, com a sua produção, veiculação e efeitos, nos desloca, ou desdobra, numa esfera própria à antropologia. Nesta esfera o problema que se constitui é o da produção de pensamento, distinto daquele da descrição de características etnográficas, seja da sociedade ou de sua cultura.
Trabalhar com produções discursivas: cartilhas, mitologias, herbários, pesquisas monográficas, cancioneiros, músicas, documentários etc, coloca o texto-comentário em um ponto de inflexão, ângulo estratégico na definição da perspectiva etnológica.
O que havemos de conceituar em neste método como filosofia da implicação é a prática de se utilizar do recurso que está sendo decifrado no texto-objeto como recurso discursivo próprio à abordagem antropológica.
Só há sentido em conferir tais recursos a medida que nos desdobramos com esses recursos sobre o texto análise, empregando-os no comentário.
Assim, estabelece-se uma continuidade entre texto-objeto e texto-comentário que nos interessa como teoria antropológica e metodologia. Apaga-se a fronteira entre os textos, situamos num mesmo plano os textos.
Dessa forma, ao invés de o texto-comentário explicar o texto-objeto é o texto-objeto que se implica no texto-comentário. Com essa redefinição da relação entre o texto e seu comentário, redefine-se prontamente a relação entre antropólogo e nativo, esses dois lugares discursivos, essas duas funções enunciativas da narrativa antropológica.

O que se define aqui por teorias nativas, tema da antropologia por excelência, é o processo de constituição de instrumentos de pensamento, vias que permitam a produção de conhecimento, a articulação de linguagens.

Portanto, a intenção que aqui se explicita é lançar-se em busca dos recursos que nos forneçam dados para análise do material etnológico descrito.
A hipótese didática deste trabalho é que o material fornecido pelos professores indígenas pode tornar-se um importante instrumento na compreensão da especificidade da pesquisa antropológica.
Este trabalho mesmo, portanto, deve se constituir no principal beneficiário desta hipótese.

lautrec pinta van gogh
o que revoluciona a antropologia no século XX é o estabelecimento de uma teoria lingüística fundamentada no significante;
nessa perspectiva, a língua é uma forma, o que abre novas dimensões para a epistemologia, para a crítica das ciências humanas, para as redefinições metodológicas, para a circunscrição do pensamento europeu diante do mundo e das outras culturas;
a estrutura vem a tona, a linguagem é uma forma estabelecida a partir da convenção, é um sistema de diferenças, em que inclusive o vazio pode ter função, em oposição a determinados morfemas;
a linguagem deixa de ser tomada como produto da representação, focada no referente como queria o pensamento positivo do século XIX, para colocar problemas como a determinação do pensamento filosófico por essa concepção de linguagem e vice-versa, como essa concepção de linguagem era determinada por um viés filosófico que caracteriza o pensamento europeu;

30 agosto 2006

a morte de deus pode ser pensada como um problema discursivo; visando lançar luz mais sobre o problema do discurso do que nas propriedades divinas, gostaria de pensar o tema filosófico da morte de deus como um efeito da problematização do discurso;
perceber a espessura do discurso, o que rompe com a natural transparência da dinâmica da representação, é o problema ou ponto de inflexão a partir do qual não se pode retroceder;
a natureza discursiva, depois de se dar a conhecer, ameaça devorar, desmoronar o mundo constituído pela linguagem da representação;
reconhecer a ordem do discurso depois de tantos séculos de vigência do discurso da ordem, da ordem da representação, requer uma reformulação no conjunto das referências do pensamento;
por isso, uma questão que se coloca em derrida é como criticar um discurso, no caso, a metafísica, utilizando os próprios termos que a reproduzem;
uma metodologia da implicação ou uma metodologia baseada numa filosofia da implicação articula elementos diversos: filosofia da imanência, teoria dos enunciados, política discursiva,
essa metodologia se define por buscar ir além da explicação, que acentua o caráter transparente da linguagem, dobrando-se sobre o princípio metatextual, evidenciando a natureza criadora da linguagem na produção do conhecimento;
neste processo, a linguagem utilizada na construção do texto é tomada como material, como conteúdo a ser problematizado;
com isso o meio e a linguagem em que o matéria é veiculado não são neutralizados para soarem naturais, não são naturalizados;

24 agosto 2006



você foi o primeiro a nos ensinar algo fundamental: a indignidade de falar pelos outros
deleuze-foucault, 1972

o perigo é a estrutura narrativa própria ao texto antropológico; ou ela se volta para si, problematizando e redefinindo, via metodologia e textualização, a multivocalidade própria ao discurso antropológico; ou de outra forma, ela é arrastada pelo atavismo do dar voz aos marginalizados, quando, na prática, o que faz é ocupar toda a pista com seu discurso ao mesmo tempo autoritário e paternalista;
reconhecer, portanto, a natureza da linguagem, inicialmente como ela se constitui no pensamento ocidental, no pensamento do século XIX, e, depois, mais especificamente, na antropologia, redefinindo a disciplina genealogicamente, numa “história” dos discursos (não linear, não progressiva, ao molde dos precursores de kafka, de borges);
dizia o perigo, pois aqui mesmo, deste teclado, já saiu a seguinte definição de antropologia: é a arte de falar pelo outro, de agenciar vozes no discurso, gestão de enunciados;
desta forma, como não fazer do primeiro passo esse apontar de lápis, essa definição do foco narrativo e do tratamento as vozes que de cara já evidencia os planos discursivos que constituem o texto antropológico;
a partir daí, a operação evidencia sua dimensão, seu plano formal, desdobrando o texto sobre si mesmo, montando uma pista paralela que volta e meia, em pontos de inflexão, reflete os recursos discursivos que estão sendo utilizados, que estão constituindo o plano de imanência em que o texto compõe a própria prática de sua própria teoria;
nosso desafio hoje, não é mais o de enveredar-se pelos labirintos das teorias antropológicas e filosóficas; nossos orientandos necessitam de colocar em prática uma autêntica perspectiva antropológica em suas pesquisas;
pergunta-se: como fazer desse intrincado percurso filosófico, metodologias simples, que demonstrem na prática a distinção entre a verdadeira antropologia e o atávico histrionismo de concepções pseudo-antropológicas;

no caso da pesquisa iniciada junto aos ashaninka, tem sido voltar-se à constituição e redefinição da concepção de produção de conhecimento, a qual, de forma simples, evidencia a constituição dos dois planos que se constituem na pesquisa, sendo um deles o metateórico, aquele que volta o texto sobre si mesmo, e o outro o do saber indígena como processo de construção, de produção do qual se devora os procedimentos e métodos;
produção de conhecimento gerando produção de conhecimento, texto gerando texto; com isso, desvincula-se da relação com um mundo objetivado, com um sujeito objetivado, com um objeto; textos se alimentam de textos e alimentam novos textos;
o texto objetiva textos e seus procedimentos de constituição, numa vigília constante da dimensão que o coloca em contato;
o enfoque que estava voltado para um mundo objetivado, um campo de referentes metafisicamente objetivados, volta-se para a imanência do universo a produção textual, a natureza da produção de conhecimentos, onde os textos se constituem de textos e o discurso indireto caracteriza a natureza da linguagem;

pergunta-se: com isso o texto não se aliena em uma metalinguagem estéril; questão colocada, e deslocada ao mesmo tempo, por Latour;
pelo contrário, o texto se volta para sua natureza textual, o cientista fala de ciência;



acertada a viagem;
saímos sete horas de rio branco;
passamos na colônia do esposo de dona menina, tomamos um café e um pão caseiro com margarina;
passamos na vila do incra para pegar carne;
ao chegarmos, encontramos dona maria paula, que no recebeu e já preparou uma merenda; merendamos pão de milho com ovos fritos e arroz; seu cícero e os demais já estavam na área onde ocorreria o mutirão;
o grupo que chegou de porto acre não veio preparado para o mutirão, com instrumentos, veio preparado para uma visita; seu valdir que estava por lá na chegada do grupo, encaminhou-os primeiramente para a usina de agroindústria, onde está sendo montada a desidratadora de alimentos ou secadora de frutas;
seu valdir apresentou a secadora, contou um pouco de seu histórico, falou de custos e produção;
depois disso, deixamos a área do seu cícero e fomos para a visita à área do seu valdir; se os visitantes já estavam impressionados com a agroindústria, ficaram entorpecidos com a enxurrada de informações que seu valdir nos oferecia a cada novo espaço que adentrávamos em sua colônia; cada espaço estava caracterizado por certo consórcio de espécies;
pupunha, abacaxi, mucuna, feijão de porco, maracujá, milho, banana, mamão, cerejeira, cupuaçu, copaíba etc; um espaço mais rico e colorido que outro; uma grande diversidade de formas, de cores e cheiros, de texturas e solos;
voltamos avexados, os visitantes tinham compromisso; eram muitas as informações que seu valdir tinha para passar; muitas para um dia, uma semana, um mês, talvez um ano;
voltaram todos impressionados; um deles, presidente de uma associação, disse que muitos queriam voltar no dia seguinte, transmitindo o entusiasmo que tomara os visitantes;
voltamos para o almoço preparado por dona maria paula e equipe; o grupo organizou a despedida com algumas falas dos representantes dos visitantes; o secretário de agricultura de porto acre estava presente nesse momento;
após a partida dos visitantes, o grupo de agricultores do humaitá reuniu-se com o secretário; o secretário colocou a situação problemática da secretaria e da prefeitura;
resultado: a partir da próxima semana os produtores terão que arcar com o óleo do caminhão que os transporta para a feira; quarenta litros de óleo a serem divididos entre esses produtores;
a comunidade conseguiu do secretário, em compensação, um encontro com o senador sibá machado na próxima sexta feira, no qual participarão seu borges, presidente da associação da comunidade e marinelson, pelo arboreto;

logo de início, nas apresentações, apresentei-me e fui apresentado por caetano;
foi lançada, então, a proposta de elaboração de um vídeo documentário abordando o histórico e o trabalho do grupo;
o que foi colocado é que o roteiro do trabalho não está definido e que, a princípio, seria apenas captação de imagens até podermos sentar com o grupo e definir o roteiro, incluindo projeto; todos foram favoráveis ao projeto;
um colaborador da proposta de documentar o trabalho dos colonos foi o sr. laudino que se referiu a um material gravado nos anos noventa com os pioneiros da agricultura orgânica no acre;
sr. laudino sugeriu que cortássemos os depoimentos dos produtores que não seguiram no trabalho e mantivéssemos as imagens daqueles que ainda estão no movimento, estabelecendo parâmetros comparativos entre antes e agora;
conta-se ainda que seu laudino sempre propõe projetos de captação de imagens em sua colônia, espaço conhecido como verdadeiro laboratório da produção em sistemas agroflorestais;
nesse dia acertei com o grupo do humaitá: seu valdir e seu cícero, e o pessoal do pesacre: marinelson e márcio, para uma visita na área do seu cícero, onde haveria um mutirão no dia seguinte; acertada a viagem;


foi realizada nesta segunda feira, dia 21 de agosto, no ministério da agricultura e abastecimento, mais uma reunião dos produtores orgânicos da região de rio branco;
estavam presentes os produtores dos três grupos de agricultores orgânicos: humaitá, benfica e moreno maia;
todos eles comercializam seus produtos na feira de produtores orgânicos de rio branco que ocorre todos os sábados e domingos em frente ao terminal urbano;
na pauta estavam desde questões de organização institucional, como o cadastramento dos agricultores, bem como a organização da feira, como a redefinição da comissão da feira, e até uma reunião com o secretário municipal de agricultura;
iniciou-se discutindo os problemas de cadastramento do grupo; daí explodiram uma série de problemas relativos a organização da feira; detectou-se o seguinte problema: a feira estava com sua comissão defasada; votou-se, entre as comunidades, uma nova comissão, incluindo suplentes, e foram definidas atribuições cabíveis a esses representantes em casos como os dos problema mais freqüentes;

16 agosto 2006

Email enviado por Eliane Miraglia:


Oi querido,

não sei se você vai poder acompanhar mas no domingo, dia 13, o Jornal da Tarde vai publicar uma aulinha que eu elaborei para os professores do ensino fundamental.
Se puder dar uma espiada e quiser comentar, sua avaliação é muito importante para mim.

Beijos

Eliane

14 agosto 2006

12 agosto 2006

a produção de conhecimento entre os indígenas do acre

referencial teórico

“O conjunto dos mitos de uma população pertence à ordem do discurso”. (Lévi-Sttrauss, Le cru et lê cuit)

articular a tradição de mauss de pesquisar o conhecimento indígena e não objetualizar o indivíduo e/ou a sociedade indígena, e sim compreende-la como construção simbólica similar à nossa, o que leva a deslocar o problema de um campo homogêneo no qual se situam as diversas sociedades (o índio genérico) para campos específicos de construções simbólicas e sistemas de produção de conhecimento;
a partir dessas propriedades específicas essa tradição antropológica inaugura um campo de estudos no qual a teoria nativa passa a ser a matéria privilegiada, pois possibilita a experiência prática e teórica com esse conhecimento, seus métodos, seus procedimentos;
essa escola conduz a partir dessa sua concepção de antropologia e de produção de conhecimento e o corte proposto, segundo o qual o problema das culturas não se restringe ao mero problema de conteúdo, principalmente no que diz respeito à produção de conhecimento, o problema da especificidade própria ao olhar etnológico entre as culturas ganha dimensão formal;
dessa forma é que se pode escapar ao etnocentrismo vigente na origem da antropologia e se propor uma ampliação de seu espectro, de sua área de abrangência;

referenciais filosóficos: do pensamento da imanência de gilles deleuze ao perspectivismo de viveiros de castro

nesse sentido toda a filosofia da imanência em que consiste a obra de deleuze tem servido ao estabelecimento de possibilidades metodológicas para a etnologia;
deleuze fornece subsídios filosóficos, instrumentalizando-nos para problematizar uma possível etnofilosofia;
em autores como platão, nietzsche e leibniz, deleuze traça um percurso que circunscreve esse princípio de homogeneidade que caracteriza a cultura ocidental, fundamentalmente em sua tradição judaico-cristã;
com os instrumentais dessas filosofias redefine conceitos que abrem possibilidades de fecunda apropriações para a nossa área de pesquisa;
voltando assim à tradição de mauss, problematizada após o estruturalismo e a problemática da forma, do significante, da estrutura, pode ficar mais claro essa abertura que se faz no sentido de deslocar o problema do conteúdo, princípio de homogeneidade que leva à comparação quantitativa as culturas, para a questão da forma, que traz no seu bojo, associada à ruptura com a homogeneidade citada, um princípio de diversidade, de multiplicidade;
essas reflexões teóricas advém de problemas práticos de pesquisa e metodologia; não haveria uma forma mais apropriada para o tratamento de qualquer tema; a pesquisa, a dúvida, o problema conduzem à produção de um percurso, a elaboração de uma forma; a forma passa, assim, a operar com sua potência produtora, criadora e não mais como mero suporte do conteúdo; ela não só é parte da experiência de elaboração do trabalho, mas toda potência criadora do mesmo;
na contracorrente da afirmação positiva de metodologias gerais, que serviriam a qualquer tema a ser abordado, a antropologia oferece a seguinte fórmula: o tema determina e é determinado pela forma;
portanto o tema, a matéria que o pesquisador se propõe forjar determina sua forma, ou melhor, sua gama de possíveis, seu coeficiente de possibilidades formais que será articulado com a experiência prática de campo, com suas contingências, coincidência, novos aprendizados, novas fontes, novos temas, enfim, seus inúmeros feed backs;

a explicação e sua imagem a partir do princípio de implicação

o método proposto por este referencial não tem por fim a explicação, cujo pressuposto seria a neutralização da especificidade formal, especificidade formal que é a grande contribuição da antropologia, via estruturalismo, para o pensamento humanista;
visto que a explicação, fixada sobre os conteúdos, se definiria pela homogeneização da forma, deslocando sua atenção ao plano da heterogeneidade de conteúdos colocada, por exemplo, por uma metodologia centrada na história, em detrimento da heterogeneidade formal que afirma a multiplicidade e coloca em questão uma forma homogênea e universal, seja ela naturalizada com a história, ou artificial como modelos metodológicos formais (matemáticos, estatísticos etc);
o que se busca com esta reflexão é estabelecer duas imagens do pensamento para que se defina a prática que constitui, a prática em que consiste nosso atávico pensamento da explicação;
para tanto, pode-se contrapor à explicação o princípio de implicação que rege esta metodologia;
princípio de implicação devido ao trabalho estar situado no mesmo plano de sua realização, de ele não se retirar do plano empírico da pesquisa de campo para o campo transcendente das idéias de onde o descreve; e essa imagem do conhecimento que estamos problematizando;
instrumental

dada a apresentação do referencial teórico específico da área que nos conduz a este problema e sua pertinência metodológica dá-se prosseguimento à sua apresentação, explorando-se agora seu instrumental;
a articulação da etnofilosofia com a etnopsicologia já vem expressa há muito, pelo menos desde os texto de mauss; o primeiro instrumental que nos servirá para explorar a produção de conhecimento é a configuração discursiva do texto, o jogo de vozes que constitui o texto, elemento formal central na construção do sentido em antropologia;
a peculiaridade de nosso material deve oferecer bom material já não nos limitaremos exclusivamente à material etnológico teórico ou produção de conhecimento metateórico;
a maneira de ir além desses limites clássicos do estruturalismo, metateoria entre textos de antropólogos brancos, é a abordagem de um material que foge à estrutura clássica de enunciação da produção antropológica: o antropólogo escreve sobre o grupo, apresenta seus costumes e seus conhecimentos com seu olhar objetivo;
a problemática enunciativa na qual se inscreve nossa matéria problematiza já a princípio o primeiro instrumental que estamos abordando, o jogo das vozes, o regime enunciativo próprio ao tem abordada, definidor da forma que dará luz ao texto, à narrativa antropológica e etnográfica;

instrumental: o regime enunciativo

um dos campos que se abre imediatamente à exploração de instrumentais de um pensamento da imanência próprio a este princípio de implicação se refere às implicações dos regimes enunciativos no campo das ciências sociais;
a associação do estruturalismo à lingüística continua bastante fecunda visto que um dos instrumentais formais mais utilizados na área em questão são estudos de construção de complicados sistemas de enunciação;
esse instrumental vai desde o simples uso do discurso indireto até intrincados jogos de vozes que constituem a base de aplicação, de configuração, de constituição, de produção do princípio de implicação em determinados pensamentos;
temos aqui como obra de referência em nosso pensamento os araweté e eduardo viveiro de castro, em que o regime enunciativo do xamanismo araweté se dobra na superfície do texto, sendo problematizado e atualizado no próprio texto, constituindo uma experiência limite de implicação da teoria nativa na narrativa etnológica;
dessa forma, as possibilidades discursivas práticas não se restringem às reflexões em teoria do discurso; constituem o exercício de práticas discursivas, práticas formais que darão constituição a produtos distintos daqueles;
um exemplo são os trabalhos de autoria coletiva que problematizam a constituição formal da produção de conhecimento; o modelo de pensamento que aqui se problematiza opera com uma concepção de autoria cujo modelo é o da constituição psicológica individual, o modelo do sujeito ocidental forjado pela tradição racionalista de platão a descartes; é o modelo da explicação que situa o exercício da produção de conhecimento na dimensão transcendente, sem automatizar a implicação do conhecimento sobre o conhecido, criando, dessa forma, um abismo entre conhecimento e experiência;
portanto, redefinir a imagem ou o formato do narrador e da narrativa antropológica é um desafio que nos é proposto; ainda que possamos desacreditar da importância de tal problema, considerando-o mero preciosismo formal, é desta propriedade formal que advém a especificidade da antropologia e sua contribuição não só às demais disciplinas e ciências, como à própria matriz do pensamento ocidental;

o problema da produção de conhecimento

situando-se, assim, no campo da produção de conhecimentos, faz-se necessário ao pesquisador traçar sua linha, seu próprio método que dê conta de retratar o ângulo de sua observação ao problema selecionado;
a vantagem inicial de operar com o viés da produção de conhecimento, de abordar este problema, advém certamente de sua natureza simbólica;
além desta propriedade, que nos permite estar constantemente atento à natureza produtiva, constitutiva de nosso material, não correndo o risco de naturaliza-lo ou essencializa-lo, problematizar a produção de conhecimento nos fornece uma possibilidade metodológica interessante, visto que o material possibilita a dobra e o constante reflexo autopoiético de que resultará a pesquisa;
o que se quer dizer com isto: o tema da produção de conhecimento constitui a prática da própria pesquisa; esta natureza comum possibilita um jogo entre forma e conteúdo que deve resultar numa reflexão interessante;
não se distinguirá meramente forma e conteúdo, pelo contrário, a natureza do tema conduzirá a uma reflexão metateórica e prática sobre o problema da relação forma/conteúdo;
o material abordado possibilita portanto uma reflexão que se passa no plano do conteúdo, mas que em momento algum deixa de estar vinculada à problemática formal;
a própria análise do material recai sobre os procedimentos da metodologia empregada na produção do material em análise;
esta descrição dos métodos empregados na obra analisada torna a se dobrar sobre o próprio corpo do trabalho, abrindo caminho para uma reflexão sobre o método empregado na pesquisa em andamento e para pautar a método-logia que esta sendo constituída pela pesquisa em ação;

a biblioteca de babel e o problema político da antropologia

esse jogo da pesquisa dentro da pesquisa nos abre uma ampla gama de possibilidades criativas que conduzem a fecundas reflexões teóricas resultantes desta prática;
o metatexto nos desvincula da ilusão da objetividade própria do texto científico em sua narrativa realista e direta; reconhece aqui a natureza textual dos discursos, sua natureza simbólica, mesmo material de que é constituída a cultura;
esta propriedade caracteriza a linha de fuga própria à antropologia: a descoberta do significante nos lança no universo das produções simbólicas que se alimentam de produções simbólicas, problema que nos conduz ao cerne da antropologia: a questão política;
já é claro como o positivismo radical de há poucas décadas perdeu sua eficiência política com a intensificação do discurso democrático que pudemos ensaiar no fim do século da modernidade, que para nós foi o século as ditaduras;
ainda que esse positivismo radical tenha caído em desuso, o século das ditaduras foi um terreno propício ao seu enraizamento, e aqui está o nosso problema: nos é difícil reconhecer até onde vai as raízes dessa planta;
esse problema é que faz do campo em que nos situamos um terreno minado, no qual os discursos mais democráticos, que pregam a igualdade podem ser os mais populistas e reacionários a que já deu a luz;


a produção de conhecimento entre os indígenas do acre

o objetivo do projeto é a definição de um marco conceitual visando a definição de produção de conhecimento;
o método é procurar construir um percurso no qual se definam e articulem concepções de produção de conhecimento;
desde de o que os antigos entendem por produção de conhecimento, passando pelo instrumental fornecido pelo projeto de autoria, chegando ao que se entende hoje por autoria e ao que se pratica hoje como para além da autoria ou autoria redefinida;

o projeto de autoria tem como campo de abrangência a escola indígena e a construção do material didático específico para uso em sala de aula;
para a construção desse material, os professores indígenas tinham necessidade de organizar o conhecimento dos antigos, visto que se definiu o enfoque da educação indígena sobre o conhecimento tradicional;
para a realização dessa organização, dessa sistematização de conhecimento, esses professores foram instrumentalizados de procedimentos de pesquisa antropológica;
os próprios professores se tornaram os pesquisadores, coletores, antropólogos de suas culturas;
com esse instrumental os professores deram início às pesquisas e, em pouco tempo, já tinham um vasto material sistematizado nos mais variados campos do saber tradicional, dando fruto a uma diversidade de publicações;
já nesse primeiro momento, as publicações escritas traziam a forte marca da identidade visual elaborada pelos professores indígenas em seus processos de formação;
o verbal tem uma significativa articulação com o a linguagem visual dos desenhos constituindo a forte identidade do material que se tornou a assinatura dos trabalhos a opiac e a cpi-acre;

da escrita e depois
ao longo dos anos noventa os professores vão conhecendo novas possibilidades de pesquisa; a internet desponta como instrumento de trabalho acessível, as organizações se fortalecem, a opiac é constituída, o projeto vídeo nas aldeias chega ao acre, a cpi reformula seus métodos de trabalho, surgem os agentes florestais indígenas, o governo se torna governo da floresta;
daqui, dois processos nos serão fundamentais: o desdobramento e ampliação dos processos de produção de conhecimento, desdobrando-se nos vídeos produzidos como material didático (agentes florestais indígenas) para além dos livros;
o outro processo que terá importância capital para este projeto, por sua proposta de trabalho, é o potencial comunicativo e político que se descobriu com a internet;
descobriu-se na internet uma nova comunidade, uma nova mídia; essa mídia tem garantido ao ashaninka o direito à voz num circuito de comunicação mundial;
a partir dessa descoberta, passou-se à constituição de uma rede de interlocutores, possíveis parceiros para projetos, utilização de outras mídia;

como coordenar as possibilidades formais dessas mídia com a educação, a organização política ashaninka, a produção de conhecimento e o projeto aqui proposto;
tais processos de produção de conhecimento serão objeto de reflexão e de proposta de trabalho por parte deste projeto; o formato, a linguagem dessas mídias deverá ser integrada neste projeto, que possui marcante dimensão metalingüística devido ao seu referencial teórico;
ambos os trabalhos devem resultar num projeto coordenado de ação específica: primeiro um vídeo sobre a produção videográfica como processo de produção de conhecimento, de escrita, de linguagem; pode ser enfocado o meio de produção de material didático audiovisual;
segundo, um agenciamento virtual que vise a articulação de informações sobre povos indígenas, pesquisando o material e o canais já existentes; daqui pode resultar uma nova forma de pensar o espaço antropológico, de fazer etnografia, etnologia, de pensar a socialidade tribal, comunitária;
para tanto há que se pensar esse processo de troca entre processos de produção de conhecimento, organização social e a constituição da imagem de si construída e reconstruída pelo grupo;

estamos propondo um debate que visa o levantamento de possibilidades de propostas de trabalho; projetar a educação nesse processo constituído ao longo dos últimos anos, projetando os jovens e suas possibilidades na articulação junto a esses mídia; a escola imaginada em sua dinâmica traz possibilidades que não se concebe na observação interna à sala de aula;

04 agosto 2006

eu estava dentro da mata...


segundo a experiência que tive no pouco tempo da ocficina e no longo tempo de convívio, aproximadamente dois anos, de consumidor dedicado de produtos orgânicos, pude perceber processos e métodos de transmissão e produção de conhecimento próprios a este grupo;
no entanto, talvez o mais interessante ao recorte antropológico e que valha a pena e a tinta, é a situação desses agricultores orgânicos diante do mercado hegemônico, dos metódos de produção do agrobussines, a experiência dos apurinã como manejadores de sementes e de fauna indiretamente etc, portanto esse discurso diante do discurso hegemônico da exploração predatória, da exploração do animais criados engaiolados para serem vendidos congelados nos supermercados;
certo que não se pode fugir muitas vezes de discursos capitalistas que vêem nos orgânicos um produto mais rentável, este uma rara excessão, ou do discurso piegas do ecologismo infiltrado, no entanto, mesmo em meio a esse discurso ecológico importado dos ecologistas urbanos, pode-se ouvir dissonâncias selvagens que ultrapassam o pieguismo do ecologismo; este que eu considero ser o recorte antropológico mais interessante no que me toca; como esses homens constróem seu mundo, militam na agricultura num mundo em que a alimentação humana virou uma guerra, um campo ocupado pelo comando que atua no poder da homogeneização global;
interessante, talvez servir-se deles para quebrar com a imagem de uma naturalidade diante de nossos bizarros hábitos alimentares; outra coisa que talvez possa ser interessante é a sedução que o mundo dos enlatados e dos industrializados tem frente a esses homens; muitos não consomem ou consomem pouco os seus próprios produtos, visto que acompanham a alimentação normal dos outros seres humanos;
o problema antropológico da alimentação deve ser uma reflexão interessante de se fazer; articula problemas como a saúde, cultura, economia, ecologia e sustentabilidade entre outros; a cultura da carne, sua instituição e suas consequências é um problema que pode e deve ter uma entrada antropológica; como se procede à criação de hábitos alimentares bárbaros que parecem tão inocentes;
para quebrar com o modelo linear de buscar na história os subsídios para realizar esta crítica, pode-se buscar em outras civilizações os seus costumes em relação à alimentação para comparar com os ocidentais;
memória da oficina microrregional da acs certificadora sócioparticipativa da amazônia
realizada na aldeia dos apurinã; a certificadora sócioparticipativa tem o intuito de certificar os produtores de produtos orgânicos e manejados na amazônia e no acre; funciona dessa forma como um laboratório que coloca em contato e desenvolve projetos de autoria coletiva entre os produtores;
nossa intenção é estar refletindo sobre o valor antropológico da produção em agricultura orgânica e, igualmente o teor antropológico do trabalho sócioparticipativo da acs; estamos envolvidos em projetos de produção de conhecimento, refletindo e produzindo uma teoria para matriciar tais conhecimento numa rede de princípios antropológicos que defina uma teoria da antropologia educacional a partir das experiências de produção de conhecimento sócioparticipativo no acre;