08 abril 2007

ilusãofilosofia e antropologia IV

começou-se a desmontar a máquina metafísica, ou melhor, a compor a máquina nômade da imanência, com nietzsche; certo que há referências para chegar nele, mas foi esse autor que comprou a briga e profanou a tradição metafísica do pensamento ocidental, revelando inclusive seu comprometimento com a religião em pleno século vinte (pode-se dizer);

esse percurso tem paradas importantes nos pensamentos de kant e hegel, mas quem retoma o pensamento grego definindo, com os cacos de sua metafísica, um plano de imanência em mosaico é o pensamento nietzscheano; é esse plano de imanência que o autor pretende definir em sua obra a concepção do trágico; a ruptura com a linguagem universalista e objetiva da identidade hegeliana que proporá uma saída via história; essa saída via história é a partir daquilo que chama espírito do tempo, a forma que ele encontra de estabelecer uma diferença num campo de homogeneidade absoluta, no qual o pensamento ocidental só pode diferenciar-se de si mesmo, no tempo;

a cultura no pensamento ocidental, portanto, se define a partir de hegel e seu espírito do tempo, por via histórica, no tempo progressivo de uma única cultura; a cultura se define a partir da identidade e não da diferença; o problema da diferença é um problema que aparecerá mais tarde, quando o progressivo e o evolutivo forem mais um pouco exorcizados e o pensamento se libere de si mesmo, de sua identidade;

hegel, portanto, devolve o problema das alturas das idéias universais para o mundo social dos homens; no entanto, sua concepção de história e de cultura são forjadas nessa mesma matriz de tradição metafísica, não servindo muito para as vicissitudes apresentadas pelo problema por ele levantado;

como dizia, nietzsche ao problematizar a história nesse quadro, demonstrando o caráter político da epistemologia dela tributária, propõe uma entrada genealógica em que a história é circunscrita como operando em harmonia com essa epistéme da identidade metafísica;

em sua ruptura o autor não só escapa dessa tradição, como já fora buscar um plano de imanência próprio no pensamento trágico pré-socrático;

é a partir desse princípio epistêmico, desse pensamento da diferença, que o pensamento de clastres nos conduzirá rumo às sociedades anti-Estado, às máquinas de guerra como foram chamadas por deleuze-guattari quando de incorporação como referência na filosofia das multiplicidades de mil platôs;

a proposta de clastres é a da constituição desse pensamento da diferença; percebe-se em seu trabalho a intenção de se pensar com o pensamento outro, de buscar nesse pensamento não apenas sua ordem interna, mantendo-o como objeto passivo de nosso pensamento, e sim reformular o nosso pensamento desde seus princípios, através do poder trazido por esse paradigma da diferença para um pensamento cuja tradição está calcada na identidade; pensar o pensamento outro sem objetifica-lo na restrição de descrever estruturalmente suas categorias, demonstrando arrogantemente “olhem, eles pensam racionalmente, viram como a razão tinha razão, até o índios podem pensar, se encaixar no pensamento racional, desde que respeitem suas regras etc....”;

o potencial do pensamento selvagem será outro, no entanto; não poderá se manter tão comprometido com a tradição desse pensamento da identidade, sob a pena de se tornar um instrumento dessa própria tradição;

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