05 dezembro 2011


alianças demoníacas 2

o biotecnólogo coloca o problema da tecnologia, ou melhor, a tecnologia como solução dos problemas presentes e futuros;
essa idéia da tecnologia como solução, principalmente como salvação, é antiga;
mais interessante ela vem se tornando quando se trata da tecnologia sanar problemas criados pela própria tecnologia;
no entanto, não retrocedamos: estamos imaginando aqui se não seria indissociável a tal tecnologia (termo problemático) e as sociedades e socialidades que lhe dão sentido;

colocando o problema da tecnologia: é/seria/será possível usufruir dos benefícios da modificação genética sem estar na mão dos laboratórios, sem entrar na dependência de suas cadeias?
esse é o problema: o problema político do conhecimento: o saber não se dissociaria  do regime de poder que lhe dá origem;
não há como pensar numa sociedade hiper capitalista, uma biotecnologia que sirva ao bem estar comum;
numa sociedade em que o bem comum foi relegado a uma posição meramente estratégica, a manutenção da democracia, e o mercado alçado à posição de regime político e campo de forças da democracia, não se pode esperar que a biotecnologia sirva para resolver nossosproblemas;

vejamos algumas da estratégias montadas pelos laboratórios para estabelecer tais cadeias, sua relação com o conhecimento tradicional, sua contribuição para o aumento na quantidade de alimento disponível (relação entre produção e diminuição da fome);

essa forma de produção está sintonizada com uma idéia de sociedade 100% urbana e totalmente monetarizada, o que significa que não ter qualquer dinheiro, viver na miséria é mais importante que comer o seu próprio alimento;
monetarização é sinônimo de controle;
tudo está circulando no mercado, inclusive os contingentes populacionais; 

a agricultura familiar é hoje uma das frentes de resistência a esse sistema, do qual não conseguimos separar a biotecnologia ou os transgênicos;
o contraponto a essa ciência régia está sendo gestado nas escolas técnicas e universidades dos movimentos de trabalhadores rurais e sem-terra;
é também nesses movimentos que se articula num verdadeiro coquetel molotov, questões fundamentais de nossa realidade (articuladas com o processo histórico que as influencia) como reforma agrária, apartheid social, alternativas ao capitalismo e sua relacionalidade, poderes da mídia;
é ainda nesses movimentos que tem encontrado lugar práticas diferenciadas de relacionalidade, de produção e apropriação de conhecimento, de troca e circulação de imagens da realidade e seus sujeitos, de uso e interação com a terra e o território;
toda essa produção de diferença realmente ameaça a império da unidade;

no entanto, desmascarando a falácia da dificuldade de produção (preocupação do agronegócio  monocultor da exploração predatória), percebe-se nesse processo de democratização do conhecimento que a tecnologia mais importante é a humana, a tecnologia social;

a tecnologia social associa sim certos conhecimentos da sociedade científica a conhecimentos tradicionais;
muitos desses conhecimentos das sociedades complexas são, no entanto, conhecimentos de resistência, libertários, nômades;
tecnologia social aqui refere-se à relação entre as formas alternativas de produção da agroecologia (que priorizam a autosustentabilidade, via biodiversidade, em vez do comércio, via monocultura), saberes nômades que escapam aos regimes da ciência régia (correm paralelos enquanto fazem frente ao regime majoritário) e, principalmente, processos de subjetivação aqui acionados;
a tecnologia social que visa neutralizar os efeitos do processo de desestruturação próprio das políticas públicas em zonas privilegiadas pela diversidade biológica e social, tais como inchaços urbanos, violência, monetarização generalizada em pequenas comunidades em plena floresta amazônica;
essa tecnologia social que inventa tais processos de subjetivação neutralizantes resultam da articulação de formas alternativas, menores ou outras de produção (principalmente alimentos) e de conhecimentos, e promove entre as pessoas um regime de relações que escapam ao circuito estabelecido pela dinâmica do majoritário;
nesse processo a diferença ou a diferenciação se destaca pois não estamos confrontando dois regimes equivalentes, em vez disso apontamos a emergência de regimes minoritários de relações sociais (o que não se restringe a relações humanas) que se articulam com a produção agroecológica e o saberes locais para fazer frente a um regime majoritário que generaliza a forma da relação social mediada pelo capital e pela divisão originária humanos (cultura) e não-humanos (natureza), reforçada pelo apartheid ontológico da modernidade;
tudo isso se articula num contexto em que tanto a linguagem e como a realidade do desenvolvimentismo que, apesar de precárias, conformam a imaginação e visão de mundo majoritárias, principalmente devido à política em torno da distribuição dos benefícios dos programas de assistência social;
pois é nesse contexto que deve se impor a linguagem e as práticas de reflorestamento e agrofloresta, que tomam, para tanto, desde de os discursos ecológicos fundadores das reservas extrativistas e da reforma agrária do seringueiro, até elementos mais recentes como as mudanças climáticas globais, a neutralização de carbono entre outros;

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