15 novembro 2009

representação
o figurativo


A pintura não tem nem modelo a representar, nem história a contar. Desde então ela tem como que duas vias possíveis para escapar ao figurativo: seguir no sentido de uma forma pura, por abstração; ou no sentido de um puro figural, por extração e isolamento. Se o pintor tende à Figura, se ele toma a segunda via, isto será para opor o “figural” ao figurativo1. A primeira condição é a de isolar a Figura. O figurativo (a representação) implica, de fato, em relacionar uma imagem a um objeto e buscar ilustrá-lo; mas ela implica também a relação de uma imagem com outras imagens em um conjunto composto que oferece precisamente para cada um o seu objeto. A narrativa é o correlato da ilustração. Entre duas figuras, há sempre uma história que se insinua ou tende a se insinuar, para animar o conjunto ilustrado2. Isolar é então o modo o mais simples, necessário, mas não o suficiente, para romper com a representação, quebrar a narrativa, impedir a ilustração, liberar a Figura: para deter-se no fato.
Evidentemente o problema é mais complicado: será que não existiria um outro tipo de relação entre as Figuras, não narrativo, e que portanto não destacaria nenhuma figuração? Figuras diversas que levariam ao mesmo fato, que pertenceriam a um só e mesmo fato único, ao invés de remeter a uma história e de remeter a objetos diferentes em um conjunto de figuração? Relações não narrativas entre Figuras, e relações não ilustrativas entre Figuras e fatos? Bacon não parou de fazer Figuras acopladas, que não contam nenhuma história. E quanto mais os painéis separados de um tríptico têm uma relação intensa entre si, menos esta relação é narrativa. Com modéstia, Bacon reconhece que a pintura clássica buscou constantemente traçar este outro tipo de relação entre Figuras, e que é esta ainda a tarefa da pintura: “evidentemente muitas das grande obras foram feitas com um certo número de figuras sobre uma mesma tela, e é claro que toda pintura quer fazer isto… Mas a história que se conta entre uma figura e outra anula desde o princípio as possibilidades que a pintura tem em agir por si mesma. E reside aí uma dificuldade muito grande. Mas um dia ou outro alguém virá e será capaz de colocar diversas figuras sobre uma mesma tela”3. Qual será então este outro tipo de relação entre Figuras acopladas ou distintas? Chamemos esta nova relação de matters of fact, por oposição às relações inteligíveis (de objeto ou de idéias). Mesmo se reconhecemos que Bacon já tenha largamente conquistado este domínio, é sob aspectos mais complexos do que que consideramos atualmente.

deleuze, bacon

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