15 novembro 2009


arte como livre-expressão

em parte, a rejeição a uma orientação em relação à apreciação da arte se deve às noções de gosto que se constituíram na história do pensamento e da estética e sua relação com os valores;
na medida que essa relação envolve o papel social da arte, isto é, a arte como política (dimensão inevitável da arte num contexto em que o design assume a função social da arte);
a 'arte' aparece como o negativo do design;

num movimento que fez convergir a 'liberdade' de apreciação estética, implicada na supressão da idéia de gosto, com certa preguiça mental e sensível, caiu-se no espontaneísmo da livre-expressão;

o salto que significou a liberação do gosto estético como padrão definido de sensibilidade e valores referentes à arte e ao homem-sociedade, resultou numa estagnação que nos fez ainda mais vítimas do mercado das subjetividades;

foi assim que as manifestações culturais e artísticas minoritárias corroboraram para fazer das artes o campo do design subjetivo, o espaço de onde se extraem o sentimento de identificação, a identidade social de uma periferia que tem direito ao acesso a bens de consumo, de excluídos que foram finalmente incluídos na sociedade através do direito ao consumo de produtos industrializados barateados pela massiva informatização das indústrias;


cultura da periferia e mercado subjetivo
como aquilo que chamamos de arte, as manifestações culturais, simbólicas de expressão se transformaram em mercado;
como a noção de raça, cor da pele, herança genética, posição social etc passaram a signos de uma subjetividade comercializada no rico mercado dos bens simbólicos;

aqui é interessante analisar o personagem de cidade de deus que representa bem essa transição, essa apropriação, essa abertura do mercado aos excluídos sociais;
o livro de paulo lins consiste num fenômeno literário e social, visto que visa reabilitar a história do tráfico (articulado à ditadura militar) como dimensão fundamental do fenômeno histórico de que resultamos contemporaneamente;
num mesmo movimento ele se torna play boy e os play boys passam a consumir os signos da periferia, da marginalidade (desde as drogas até o próprio crime);
o dinheiro não é problema: cena em que ele coloca o bolo de dinheiro na mão do boyzinho;


portanto, ao nos libertarmos da noção de gosto estético como um padrão social de apreciação da arte que pressupõe e implica um padrão de valores, uma imagem do homem e uma concepção da sociedade, aqui figurado na expressão de monteiro lobato sobre a arte modernista, não alçamos à sensibilidade de tarsila;

contra o programa de monteiro lobato (sério, positivo e propositivo), o programa dos modernistas que confundia poesia e poética, manifestação e manifesto, poema e piada;
ao assumir o que a arte tinha de manifesto, tornava manifesto seu plano de imanência;
eis o caráter libertário do modernismo, que foi apropriado mesmo sob as piores condições atmosféricas da vida política brasileira;

amor
humor


o modernismo ainda tinha um homem brasileiro em mente, mas já era uma contra-imagem do brasileiro do século dezenove;
essa contra-imagem já está esboçada em machado de assis, o primeiro artesão maduro da desconstrução do nacional;
já está em machado o jogo rodrigueano do trágico e do cômico;

entre o tom de monteiro lobato e o tom dos modernistas há alguma diferença;
monteiro lobato fala da arte com uma linguagem crítica, divorciada por completo do texto literário;
para os modernistas, todas as instâncias da vida são literárias;
por isso o contraste entre o sério (monteiro lobato ou mesmo daqueles que defendem tarsila) e o cômico (modernistas);


a experiência estética só se dará nas rebarbas, nas margens dessa produção molar de identidades com que o governo e o marcado de subjetividades se apropria da arte-cultura; buscar uma definição de arte já implica em determinar a multiplicidade de práticas provisoriamente abrigadas sob essa noção;

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