11 julho 2008



perigos do passado

não só não constatamos nenhuma relação de causa e efeito entre o crescimento dos recursos técnico-científicos e o desenvolvimento dos progressos sociais e culturais, como parece evidente que assistimos a uma degradação irreversível dos operadores tradicionais de regulação social;
ainda que diante de tal fenômeno seja artificial apostar numa volta atrás, numa recomposição das maneiras de ser de nossos antepassados, é exatamente o que tentam fazer à sua maneira as formações capitalistas mais 'modernistas';

guattari, as três ecologias


os povos indígenas fornecem o mais interessante contraponto á moderna sociedade capitalista, com seu modernismo positivante e evolucionista, por meio do qual o ocidental se considera a forma acabada da criação;
no entanto, o rendimento desse contraponto depende de que ele não seja reduzido ao lugar de outro da sociedade moderna;
o passado, tempo de referência execrado pela modernidade, é o tempo que está associado aos povos indígenas;
seu contraponto valorizado é o futuro, tempo paradisíaco em que o trabalho e a doença serão superados pela tecnologia;

portanto, pensar esse contraponto a partir da imagem que a sociedade moderna faz do indígena pode ser perigoso, ou melhor, consiste propriamente num aparelho de captura para, num mesmo ato, coloca-los e tira-los, ou seja, coloca-los 'na história' como espécies extintas;
assim, a primeira atitude consiste na desconstrução desse procedimento;
consiste na crítica desse procedimento de captura pelo passado, pela associação ao passado;
a partir dessa desconstrução, procede-se a produção de outras imagens do tempo, bem como a circulação de outros valores sobre o tempo, a tecnologia, a natureza, a evolução;
pensar e valorizar o tradicional significa menos cultuar o passado e mais projetar-se no futuro;

o problema é que o moderno unificou uma imagem do futuro na qual todos devemos nos projetar, que se transforma numa palavra de ordem, num processo subjetivante obrigatório;
para se acessar educação e tecnologia, por exemplo, não se concebe que seja feito senão para o reforço das relações capitalistas, enfim, da ocidentalidade moderna;
cumpre assim pensar um tradicional mais relacional que propriamente associado ao passado;
relacional no sentido de não-moderno ou mesmo contra-moderno, o que significa suprimir [ou pelo menos suspender em determinados momentos] a associação desse tradicional com o passado que não seja um passado virtual, ou seja, um passado em função do futuro;
construir relações e processos de subjetivação indígena está longe de qualquer projeção em direção passado;
[não que não possa haver culto do passado, só não é disso que tratamos ou que nos interessa;]
cada vez mais, quando linhas de fuga se proliferam e a vontades de diferença se intensifica em meio aos processos capitalísticos de monocultura subjetiva;
mesmo com o alinhamento de discursos como a religião do ecologismo [cada vez mais apocalítica visando arrebatar consumidores fiéis em massa], o mercado do desenvolvimento sustentável ou das políticas públicas;

a educação que não serve senão para reificar valores ocidentalistas, reduz-se à tecnologia [computadores, marketing, ], tecnologia capitalística de socialidade [para não dizer cultura] para a produção e pelo lucro {administração, gestão, ], essa, na mesma esteira da educação, visceralmente impregnada dos valores e da imagem de futuro ocidental-capitalista;
desses processos, deduz-se a que referências subjetivantes se deve obedecer nesses espaços de treinamento técnico;
e assim, a imagem do futuro, que figura como a grande invenção da modernidade, revela sua potência em termos de configuração subjetiva;
imagem do futuro relaciona-se aqui com processos de submissão política que estão associados com as crises dos operadores de regulação social;
crise causada por um fenômeno dos processos subjetivantes que são determinados em direções opostas;
de um lado, subjetividades que se definem por uma moral globalista, que está para além dos símbolos mais generalizantes como nação ou mesmo planeta;
de outro, por uma afirmação proto-individual, que está aquém de todas as marcas sociais passíveis de vínculos de afeto não-capitalista;

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