04 julho 2008



no princípio as mercadorias eram mercadorias;
a troca privilegiava o valor de uso;
o capitalismo mercantilizou as coisas, os processos, as relações;
tornou a mercantilização onipotente e onipresente;

há o dinheiro e o valor;
quando passaram a circular no comércio e serem trocadas por dinheiro, quando se projetaram em valores de troca, as mercadorias expandiram por outros territórios;
a exacerbação do valor de troca proporcionada pelo comércio proporcionou o fetiche da mercadoria;
a mercadoria passou então a caracterizar outros objetos, outros processos, outras relações;
o trabalho tornado mercadoria consiste num marco do capitalismo industrial;
a mais valia é categoria fundamental da economia capitalista;
o marco aqui consiste no homem passar a fazer parte da mercadoria, de seu valor de troca;
a medida que as máquinas tomam o lugar do homem, o capitalismo investe mais no processo de mercantilizar o homem, de subjetivar o homem em mercadoria;

esse processo de onipotência da mercadoria, de qualquer coisa pode ser remetida a um circuito de valores de troca, é problematizado durante o século vinte a partir da arte;
a arte consiste no processo de singularização por excelência, enquanto a mercantilização precisa remeter toda singularidade a um circuito que generalize o valor de qualquer coisa, que transforme qualquer coisa em dinheiro, em valor de troca;
enquanto a arte propõe um uso poético da linguagem, ou seja, a singularização a partir do emprego desterritorializador do significante, que subverte a convenção do contrato sociolingüístico, a mercantilização precisa de um sistema convencionado que generalize o sentido de qualquer coisa que for jogada no circuito;
a mercantilização pressupõe valores consensuais que visam a conservação do sistema de significação e recompõe sempre de forma conservadora qualquer ruptura com esse sistema de convenções;
por isso ele nunca se volta para si, ele se caracteriza por dar a perceber sem ser percebido, visto que essa dobra sobre seu próprio corpo [que ainda denominamos genealogia] denuncia suas convenções e seu caráter convencionado e consensual que sustenta valores determinados naturalizando-os;
em termo de mercados subjetivos, vimos o capitalismo se apropriar ao longo do século passado dos mais diversos movimentos de resistência subjetiva, começando pelo próprio proletariado que se por um lado se aburguesou, por outro radicalizou a marginalização dos despropriados numa queda nunca vista do valor da vida nas bolsas de valores do capitalismo mundializado;
muitos desses movimentos foram depois apropriados e recriados pela própria indústria das subjetividades;
suprimiu-se qualquer diversidade que ameaçasse as subjetividades capitalísticas em sua homogeneidade, tirando-as dos circuitos de sentido e marginalizando-as como possibilidades bizarras ou condenadas à extinção como no caso dos povos indígenas, e, de forma articulada com esse processo de marginalização, conheceu-se um processo inédito de apropriação e mercantilização de diferenças por meio do exotismo, do mercado do exótico que passa a colorir a vida monótona do homem ocidental;
esse exotismo se caracteriza por sua dose, por sua medida certa, para que o exotismo nunca se torne singularização e menos ainda processo de singularização, mas pelo contrário, para que se possa continuar colonizando a diferença, reduzindo-a ao mesmo;

consciência e subjetividade deixam sua [antiga] simplicidade quando se abandona a imagem do sujeito consumado, forjado pela máquina metafísica de produção de essencialidades;
quando os processos do devir podem tomar o lugar dessa auto-imagem de uma subjetividade organizada em organismo;
eis o ponto;
ponto em que a arte encontra o seu limite;
em que o trágico pontua o limite;

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