25 fevereiro 2008

obra de jorge rivasplata trabalhismo e ecologismo: a produção e a vida

esses seringueiros articulavam há pouco (e entre poucos) o (inconfundível ar revolucionário do) discurso do legalismo trabalhista (que pegou a pecha de revolucionário pelo espírito de marselhesa que se conseguiu apropriar, transgredir e incutir na legislação trabalhista pela assessoria de imprensa do então ditador getúlio vargas);
por necessidade e conveniência política passaram, então, de forma experimental, a articulá-lo com um discurso focado na vida, um discurso ecológico que resultava num híbrido;

ao buscar sair da condição de instrumento do mercado e assumir outras funções e personagens, os seringueiros libertos conheceram uma franca decadência, durante a qual ficou difícil sustentar o que havia de anti-civilizacional ou de sustentabilidade indígena em sua auto-concepção de tradicionalistas detentores de direitos e políticas diferenciados;
a grande maioria, seguindo os fluxos globais da indústria e do mercado da borracha de que faziam parte, achou por bem civilizar-se da forma que pode, aceitando as diversas saídas proporcionadas pelos benefícios do estado;
estudos e saúde foram e são as formas de captura mais assimiláveis pelos recém-civilizados;
se as cidades da floresta arremedam os municípios, adaptando-se da sua forma aos hábitos urbanos como o consumismo, individualismo, tecnicismo, assim como à cultura de funcionalismo de estado que impera no acre, é por que seus habitantes se subjetivam, procuram as identidades que lhes convém a partir da articulação de signos colocados agora a sua disposição;

seja via estudo ou saúde, o processo de subjetivação capitalística a que se entregam (ou que integram) esses outros articula-se com o trabalho, mercado e o consumo;
nesse contexto, ser indígena ou seringueiro e ter "direito" a sê-lo, ou seja, (no caso) ter benefícios de tanto, torna-se algo abstrato;
consiste aqui no direito à identidade étnica, biológica ou racial, mais que às formas de subjetivação diferenciadas que definem esses grupos e sua perpetuação ou não-assimilação/não-integração;
como o estado opera no horizonte das identidades, a subjetivação funciona como contra-discurso que serve à resistência desses grupos ao estado;
a medida que se tornem política de diversidade étnica do estado ou dos pequenos estados que são as entidades políticas representativas legais (organizações) munidas de seu suporte burocrático para a construção de políticas públicas;

a confusão do pensamento de estado que só pensa por identidades, ou melhor, sua forma de apropriação e desmontagem desse discurso opera simultaneamente à sua ação de cooptação às práticas subjetivas ocidentais: organização, documentação, ofícios etc;
cada povo ou comunidade precisa funcionar como empresa, ainda que como empresa social;
o estado consegue sobrepor-se e apropriar para sua lógica de poder os direitos, fazer novamente dos instrumentos e de todo o complexo jurídico seu intensificador de poder: esses grupo e sua forma de organização (desconsideradas então) precisam adaptar-se à cultura burocrática de estado;

cultura política
por isso, junto aos meus interlocutores em direito indígena, optei em diferenciar e mesmo contrapor o nosso trabalho em cultura política, ou seja, fortalecimento das tradições com suas regras específicas e reconhecimento das autoridades internas no cumprimento de tais princípios, fazendo frente aos universalizantes mecanismos do etnocêntrico direito positivo e marcando seus limites no exterior dessas comunidades, muitas vezes como um direito garantido (ou melhor, voltado contra si) pelo próprio direito positivo;
desvencilhar-se da noção de direito, cristalizada no direito positivo consiste num processo tão visceral quanto desvencilhar-se do senso comum em relação à noção de política;reconhecer não só a política que se faz com os brancos ou contra os brancos, mas uma política interna, que pode e deve ser fortalecida se não se tem como horizonte a integração à homogeneidade civilizante/homogeneizante civilidade;


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