02 dezembro 2007

hecceidades 4
tratava-se de se desvencilhar do caráter extensivo da etnografia clássica, que prima pela objetividade realista e a descrição detalhista, associada de longa data à arte dos naturalistas, para trabalhar com um material que visasse possíveis literários livres da cristalização padronizante da retórica cientificista;
por isso voltar-se com tanta insistência para o corpo do trabalho, pela intenção de compor um corpo-sem-órgãos que se emendasse às experiências mais que fizesse referência a elas, que compusesse com seu campo de intensidades um corpo com tais experiências, emitindo partículas em relação de movimento e repouso, estabelecendo com elas zonas de vizinhança;

portanto, esse foi um dos princípios científicos, tomado em seu campo de valores como pressuposto indiscutível: trata-se da identidade, princípio que remete aos fundamentos mesmo da lógica, instrumento por excelência do conhecimento científico, que possibilita o estabelecimento das categorias;
propor uma problematização de tal princípio de identidade do saber científico requer aqui não só reconstituição de sua gênese como a demonstração do campo de valores que acompanha tal princípio;
a partir daí, uma outra proposta metodológica deverá resultar;
o paradigma da criação literária e, nele, mais que a concepção de criação literária pautada no conceito igualmente aristotélico de mímese, de imitação do real, de analogia, é da noção de devires que nos servimos;

definir hecceidades, portanto, repercute em operar com um instrumental metodológico que faça frente à tradição filosófica e, daí, científica do ocidente;
um dos primeiros movimentos consiste na apreensão daquilo que culminará com a concepção histórico transcendental do século dezenove, o espírito de objetividade e neutralidade axiológica do positivismo, enfim, da tradição metafísica ocidental, matriz do representacionismo clássico;
da supressão do corte essência/aparência, mundo/representação, resultará uma metodologia que busca seu paradigma na literatura e seus devires visando redefinir, amansar a retórica científica;

ao propor hecceidades em lugar de ordens, de padrões abstratos, elabora-se a questão dos pressupostos e dos valores que os mantém;
esse problema abre para uma outra questão;
trata-se de trazer à tona algo que ficava no estrato dos pressupostos e constituía aquilo que será concebido como plano de imanência, um campo de valores que se absolutiza, apagando-se do campo de referências;
dobrar-se sobre o campo de valores em que ganha referências, o campo social no qual o conhecimento tanto ganha, quanto constitui sentido, eis o gesto proposto pela genealogia;daí, não se restringe ao trato de conteúdos, pois a própria forma é convocada a voltar-se sobre si, daí seu caráter metateórico;


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