02 dezembro 2007

da estrutura
dadas duas séries, uma significante e a outra significada, em caráter de relação não-motivada, ou seja, arbitrária;
com isso, abole-se um suposto critério universal de valoração, fundado no caráter transcendental e moral que permitiria reduzir todas as civilizações a uma mesma civilização, todas as culturas a uma mesma cultura, que encerraria todos os sistemas de valores a um único sistema, que reduziria todas as ontologias a uma única;
eis o fim a que se presta a estrutura como resultado conceitual de um longo processo, eis o seu lugar definido;
julgou-se, por vezes, (seja por falta de epistemologia ou filosofia à etnologia, seja pelos limites de interpretação dos críticos) a se considerar o estruturalismo reacionário, que retrocederia as conquistas da consciência histórica e das agências das minorias;

isso sem perceber que jamais fôramos modernos, isto é, dando continuidade ao mito moderno;
a concepção de estrutura assegurou então a diferença, quando o pensamento todo-história da tradição transcendental, da civilização letrada quis engolir o ser dos devires da oralidade mítica, sob o pretexto de que este não teria história, não teria participação no tempo;
a partir daí, como resposta desse devir que virá de encontro à história, ela será imaginada então de uma perspectiva inimaginável, pois que será circunscrita com formas do tempo completamente estranhas;
o mito reconfigura a história, fecunda na história uma história oral;
isso para não entrar no rito e outras temporalidades e se ficar na temporalidade do mito, temporalidade esta não tão estranha à onipresença do pensamento ocidental;
daí, o mito não redefine estritamente a história, mas toda a tradição do pensamento que está assentado na história;
do pensamento todo-história do método histórico à história desnudada, contraposta ao mito;
não história como fato, mas como disciplina, instituição;
a confusão dessas instâncias, a identidade entre a narrativa e o narrado, estrategicamente propositada, faz da história um modelo universal de captura, modelo de fazer do tempo matéria de conhecimento, de transformar tempo em conhecimento;

a noção de estrutura possibilita então os primeiros exercícios de simetrização;
são esses exercícios de simetrização que conduzirão às máquinas de guerra das sociedades contra-estado elaboradas pela etnologia;
trata-se de uma simetrização de resistência, não mais com material inofensivo, e sim como forma de colocar a antropologia e seus instrumentos nas mão dos guerrilheiros do conhecimento, dos selvagens, dos terroristas, do resistentes, do rebeldes;
trata-se de estabelecer analogias com o estado como centro de distribuição do poder e centro de distribuição de sentido;
as máquinas de guerra se caracterizam pela guerrilha, por se posicionarem contra o estado;
contra o estado significa toda uma crítica da economia do conhecimento em relação ao estado e como ela pode ser traficada, tal como armas, para essas forças rebeldes;

foi via antropologia justamente que se possibilitou o escape, a fuga da história, do conhecimento enquanto história, da forma histórica do tempo que visava narrar o devir de uma única humanidade, de reduzir a multiplicidade a um único tempo;
a simetrização propõe ainda relações estruturais entre instituições;
trata-se de levar a sério o pensamento selvagem, assumindo não o seu conhecimento a partir de nossos valores ou dos valores de nosso conhecimento, a partir dos quais destacar-se-ão as qualidades de naturalista do índio;
trata-se de propor toda uma crítica dos valores pressupostos (e mesmo escamoteados) em nossa ciência, cuja tendência à generalização se impõe;
uma crítica de sua própria constituição como escamoteamento de valores em recursos como sua objetividade exacerbada, seu caráter histórico-transcendental, sua suposta neutralidade axiológica;

por isso trata-se de superar a assimiladora contraposição história/mito, para passar a definir armamentos próprios desse pensamento, armamentos que possam servir de instrumentos para fuga ou ataque à ciência régia, instrumentos que lhe infiltrem e corrompam, que tragam a nu seus fundamentos morais;



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