23 abril 2007

som e fúria pressupostos da diferença
A ordenação linear e progressiva do tempo definida pela ciência histórica forneceu um instrumental metodológico eficaz e sintomático, que possibilitou ao evolucionismo do século dezenove definir-se não só como pensamento da evolução na natureza, no mundo orgânico, mas também como modo de explicar a dinâmica cultural (e de forma neutra) dos povos.
O tempo, na confusão entre história (os fatos) e História (ciência), passa a entidade híbrida, definindo tanto um fenômeno cultural, uma ciência, como um fenômeno natural, universal e invariável.
O que se vê aqui é uma indistinção e uma identidade entre o discurso do conhecimento e discurso da natureza, do cognoscível.

É uma tendência do pensamento objetivista naturalizar fenômenos culturais. Naturaliza-se por que o uso que se faz da história não se volta à contextualização do pensamento ou dos valores que o sustentam, a história aqui terá a função de legitimar a dinâmica do progressivo que atesta a supremacia política dos narradores da história.Nessa apropriação, a história tem pouco a ver com o processo de relativização dos valores, que persistem no etnocentrismo próprio do pensamento hegeliano.
O valor antropológico e filosófico que a história teria numa crítica epistemológica dá lugar a sua utilização como cortina de fumaça, numa apropriação política e epistêmica dessa disciplina.
A noção de modernidade guarda em si a idéia de um programa que visa harmonizar, humanisticamente, a sociedade ocidentalizante/ocidentalizada, potencialmente global nesse momento quanto aos seus mercados, que passa a deixar sistematicamente, após as revoluções do século anterior (claro que me refiro às industriais), a condição/(forma da) sujeição tradicional de colonização para assumir uma outra, da qual, inclusive, o programa da modernidade deverá orientar;

O projeto da modernidade (strito sensu) retoma os princípios do iluminismo, intermediados pelo século dezenove.
O discurso da modernidade consiste na herança deixada por esses impulsos universalistas do pensamento europeu do século dezoito e dezenove.
A antropologia ao colocar em questão, em termos metodológicos a princípio com boas e malinowisk, e, depois, em termos epistêmicos, com mauss e lévi-strauss, aponta uma via para se escapar ao modelo histórico-transcendental da tradição filosófica ocidental.
Averiguar o sentido das instituições indígenas não é mérito do estruturalismo. Outros autores já faziam e continuaram a faze-lo sem que isso se caracterize estruturalismo.
A diferença do estruturalismo para outras abordagens se define pela passagem secreta que este revela entre metodologia e epistemologia. Trata de problemas epistemológicos muitas vezes, tratando-os, estritamente, como problemas de método.
Pois o problema metodológico se mostraria insolúvel pela via do relativismo cultural, o multiculturalismo, que revelaria seus limites.
Portanto, não se trata de uma solução tão natural quanto aquela que propõe que trabalho de campo tenha sido o responsável pelo barulho que a antropologia vai causar nas ciências humanas, especialmente na filosofia que é a área aqui enfocada.
Não é tanto o encontro do antropólogo com o contexto do nativo, seu contato direto e os mistérios dele advindos, responsáveis por reformulações metodológicas definitivas na disciplina, que surtirão tal efeito.
No entanto, tal operação metodológica, que implica em colocar de lado não só o referencial histórico, definindo um outro referencial, ou uma reformulação de referenciais e, com isso, de paradigmas.
O que constituiu o caráter revolucionário de tal ruptura parece ter sido a descoberta dos fundamentos, das bases em que estava assentado esse método e até onde iam retumbar suas ondas e ecos.
Toda a unidade que sustentava esse modelo veio abaixo quando a antropologia afirma uma diferença epistemológica, um outro do nosso pensamento.
Esse outro, como se pode pensar logo reinvestindo nesse paradigma histórico-transcendental, não é o outro como figura transcendental, o que manteria intacto nosso modelo de pensamento fundado no uno e no ser.
Esse outro se desdobra em nosso próprio pensamento, o que significa que não se trata (mais) de justificar nosso ponto de vista, nosso regime enunciativo, nosso plano de transcendência que persiste ocultando sua fonte, seu plano de imanência.
A epistéme revela o incontestável valor político desse conhecimento e do modo com que ele se coloca em relação às coisas e aos outros (conhecimentos).
A diferença ressoou nos princípios desse modelo calcado na identidade do Ser, modelo que fora tão exacerbado no neoiluminismo do século dezenove, que então não faria resistência, dado o seu desgaste.


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