12 março 2007

o valor dos conhecimentos tradicionais; isaac pianko ashaninka

Em termos de encaminhamentos, vejo um momento como esse como estratégico politicamente para os grupos envolvidos serem ouvidos quanto ao seu posicionamento.

Para iniciar o debate sem muitos termos técnicos, gostaria de iniciar situando a questão das patentes que é um ponto de discussão importante, se levarmos em consideração o movimento na esfera pública.

Os grupos e instituições no Acre têm se posicionado de forma crítica em relação às patentes.

Têm mantido posições críticas, contrárias mesmo, à forma com que a patente tem sido estimulada pelo mercado global, através dos governos e seus mecanismos de garantias de direitos, ou seja, as leis e seus derivados.

É difícil falar quando o diálogo é assimétrico (de portas abertas conosco, com a sociedade, e de portas fechadas com os representantes do mercado de patentes).

Portanto, gostaria de não iniciar este debate partindo do pressuposto de que os processos de patenteamento já são pontos pacíficos, que já estariam discutidos e que estamos a debater como será agora a repartição dos recursos.

É aqui que emendo a imagem que essas sociedades e seu conhecimento assumem na legislação. Os próprios conceitos utilizados denotam claramente a assimetria com que se tratam as partes dos acordos.

Assim, além de se partir do pressuposto de que os índios, que para o Estado não tem sequer o direito à propriedade (e gestão) de seu território, podem começar a abrir o mercado dos conhecimentos tradicionais sem o devido tempo de experiências de gestão de territórios.

Caso não fosse tanta a veemência com que o mercado exige a regulamentação dos processos de repartição de benefícios, dado o alto preço dos processos judiciais que acusam as empresas de biopirataria, o que poderíamos estar debatendo talvez fossem processos que precederiam a este, mas não teriam tanta importância para o mercado, tais como :

1) Processos de gestão participativa dos territórios indígenas;

2) Processos de auto-demarcação de terras indígenas;

3) Processos de trocas de experiência e valorização do trabalho de agentes agroflorestais indígenas, nos quais as experiências do Acre pudessem ser levadas para outras regiões.

O que falo aqui não é novidade. Toma-se o remédio por que prevenir e tratar dá trabalho ou leva tempo. Ou como disse certa vez meu professor Isaac, o macaco salva a piaba da correnteza, para deixa-la morrer fora d’água.

Uma hipótese é que o procedimento adequado no combate à biopirataria, talvez começasse pela autonomia dos povos não-ocidentalizados (como chamo esses tradicionais) para a gestão de seus territórios, a gestão de seus recursos naturais.

Mas sabemos que isso equivale a reforçar sua resistência a esse processo de ocidentalização e ao mercado global.

Sabemos também que o mercado não pode esperar.

Comunidades tradicionais

A noção é problemática por diversos motivos, a começar por reduzir sociedades e mesmo povos, à condição de comunidades, um conceito bem mais restrito.

No entanto, de que vale ficar discutindo se eles vão ser chamados de sociedades, comunidades, ou povos. Há questões mais importantes para serem discutidas.

Importantes para quem?

Essa denominação é o ponto de partida de todo o discurso assimétrico sobre essas populações.

Essa condição de comunidades tradicionais foi definida no âmbito do mercado global contemporâneo, contexto do discurso da medida provisória, conforme vimos analisando.

Equivale à sociedades não-ocidentalizadas, visto que se contrapõe à sociedades não tradicionais, modernas, globalizadas.

Assim como os conhecimentos tradicionais não definem uma categoria intrínseca das sociedades não-ocidentalizadas, que resistem ao (que por suas próprias condições estão fora do) mercado global, o conhecimento coletivo (tema desta fala) só tem sentido quando contraposto ao nosso conhecimento de matriz racional, associado ao indivíduo, como construção individual, seguindo o modelo da consciência racional ocidental.


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