27 fevereiro 2007

mais da (nossa própria) crueldade
acho que compreendo agora um pouco melhor imagem construída por nietzsche quando ironiza que a compaixão num homem de conhecimento, assemelha-se a um gigante com mãos de criança;
ele se refere ao disparate entre a crueldade pressuposta no discurso da ciência e a compaixão que ordena o discurso religioso;
muita crueldade (como se diz muito sangue derramado) pressupõe a ciência, o discurso competente, que é a maneira de nos utilizarmos de nossos discursos técnicos, a qual acaba por se dispersar em nossas falas cotidianas;

assim, acaba por ser incongruente querer elaborar um tipo de participatividade que não coloque em questão a própria forma do discurso, sua disposição;
a incompatibilidade parece ser a de colocar um agente que aparece no mero espaço de referência, sem fazer intervenções no espaço referente;
assim, politicamente esse agente é absorvido passivamente, para contar como mais um elemento do discurso objetivo, perdendo a eficácia que um discurso puramente tecnicista lhe daria, afinal ele foram ouvidos, isso está legitimado;
aí está a questão que comentava que se buscava superar no grupo oimporama orereko, superar o discurso da compaixão, o discurso moral que quer dar voz a esses desprivilegiados, marginalizados;
o que interessa nesses marginalizados não é o que neles inspira compaixão, e sim sua potência, a potência discursiva que eles proporcionam ao possibilitarem desmontar o discurso universalista do positivismo que impregna nossa alma autoritária de brasileiros;
a perspectiva que é proporcionada tem lugar na instância de produção discursiva e não no campo de referência, ao qual até hoje está restrita;
o discurso moralista se alinha historicamente à perspectiva positivista, integracionista, evolucionista, que quer fazer o outro participar de algo que lhe é privado, de algo que lhe falta;
é um discurso comprometido politicamente por não fazer desse pensamento uma máquina de guerra, ou seja, não revesti-lo da dimensão política própria a todo pensamento ou saber;
elaborar, portanto, a partir do material que esses grupos nos apresentam, um saber que se contraponha ao saber técnico, civilizado, que avança sobre eles com sua hegemonia avassaladora, é assumir esse saber como máquina de guerra, como pensamento selvagem;
essa máquina política se contrapõe a concepção positivista de que a tomada de consciência política desses grupos passa pela consciência histórica e pela conquista de seus direitos, de um sistema de direitos que está comprometido na sua gênese, em seus princípios, não com esses atores, mas com outros;

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