21 janeiro 2007

da criação na ediçãono processo de edição é concebida grande parte do recursos de linguagem com que o filme consegue devir seu tema;
gostaria de exemplificar com algumas das soluções que surgiram na edição de a rota do pacífico;
um primeiro exemplo começa num problema: tinha-se o material da expo acre, tudo ao mesmo tempo muito normal e muito bizarro;
nós víamos aquela cultura bovina e considerávamos absurdo essa cultura assumida com tanta violência nesse universo do povo da floresta construído pela publicidade acreana;
a instauração dessa realidade econômica criou, no entanto, um plano para expressão de tal universo que permite a convivência pacífica desses códigos de valores, tudo perpassado pela costumeira hipocrisia brasileira;
como, então, trazer à tona o que há de bizarro na normalidade, ou melhor, nesse plano instaurado em que a violência é tomada como eixo de valores;
havia uma imagem onde jovens dançavam num show e é comum na edição (estamos trabalhando com o adobe premiere) que o som caia e a imagem fique silenciosa;
quando vimos aqueles jovens dançando recobertos pelo silêncio, evidenciou-se a imagem que se buscava, o contraste entre normalidade e bizarria;

outro momento que se descobriu um recurso de linguagem na ilha de edição;
desde há muito o diretor falava que queria trabalhar com o contraste entre o som da motosserra e imagens da estrada e da floresta;
estávamos editando um campeonato sul americano de motocross que aparece no filme para devir processos de integração do eixo bolpebra;
durante a edição do campeonato associamos o som das motos ao barulho de motosserras;
a fusão do som das motos com a imagem da estrada e da floresta não só ressignificou a imagem da estrada e da floresta, como também ressignificou a imagem do campeonato de motocross, das pessoas vibrando nas arquibancadas;
de um plano em que dominava a normalidade de um evento corriqueiro extraiu-se o sentido do absurdo de uma cultura que cultua as máquinas e seu poder destrutivo;
evidencia-se, com isso, a fragilidade humana em seu movimento auto-destrutivo;
além disso, o que mais me interessa enquanto antropólogo é que e consegue esse efeito de sentido, ao fundir o absurdo humano à serenidade vegetal (seringueira) e animal (pássaros e outros bichos);
a impressão que interessa impregnar no espectador é a do olhar de árvores centenárias e da sabedoria animal sobre a vaidade e prepotência dos seres humanos, sobre sua ignorância a respeito do processo que estão encaminhando;
a fusão dessas imagens não representa, ela deixa no plano das impressões esse jogo tensivo de olhares, esse contraponto de perspectivas;
sons como o das motos, que se associam a motosserras, e o das pessoas vibrando, que se associam às arenas, fundidos com imagens de árvores e pássaros em seus gesto cotidianos, serenos, operam um contraponto entre fragilidade e força;
consegue-se também uma perspectiva alheia ao olhar comum que sustenta o sentido de normalidade sobre os fatos humanos e revela o que há de absurdo em hábitos tão “naturais”;

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