23 maio 2006


a máquina
a primeira palavra com que os autores definem a antropologia brasileira é pessoa; a partir do deslocamento da imagem da pessoa proposta por mauss em a noção de pessoa convida-se a pensar uma etnopsicologia;
a imagem do homem do séc. XIX que forma nossa epistéme é a imagem de um sujeito sem outrem, cujo personagem conceitual é robinson crusoé;
essa concepção de pessoa é redefinida por mauss em sua teoria nativa que propõe o outro constituído a partir de sua própria imagem, da imagem constituída em suas instituições;
esse simples deslocamento tem um efeito avassalador, e mauss o sabe; seu alcance é amplo, no sentido que deverá redefinir não apenas a imagem que fazemos do outro ou do seu pensamento: essa operação consiste em redefinir completamente os princípios de nossa epistéme, que se definem por um mundo sem outrem;
esse é o efeito de tão pequena conversão, uma redefinição em todo o nosso saber, em seus métodos; é por essa redefinição de corpo e alma que passará o estruturalismo;
na sua definição de um método próprio, hilemórfico, se volta contra os fundamentos históricos do método em ciências humanas esboçados desde hegel;
já se passara pela experiência nietzsche, por sua genealogia; era necessária uma redefinição da imagem de história à qual estava integrado método das ciências sociais até malinowski e boas;
é com mauss que se vê os indícios de um método específico da etnologia;
é essa etnopsicologia que nos conduzirá a uma etnofilosofia que consiste numa teoria do conhecimento nativa ou teoria nativa do conhecimento;
essa etnofilosofia se constitui sob as práticas do xamanismo com o nome de corporalidade;
a corporalidade integra o universo das práticas rituais dos ameríndios tornado teoria do conhecimento nativa;
o modelo de uso dessas práticas é dado na obra de clastres por sua iluminação da tortura nas sociedades primitivas; o texto aborda com maestria o problema da relação entre sensível e inteligível;
clastres opera com uma escrita sensível, escrita na pele, que rompe com modelo de conhecimento ocidental; os diversos níveis interiores do texto, níveis metateóricos nos desdobram, simulando um solo arenoso, movediço;
vê-se aqui o estupefato do ocidental ante essa escrita da imanência, essa literatura da crueldade; o ocidental não pode admirar esse sistema de crueldade, essa arte trágica do corpo, de uma estética fisiológica;
escrita na pele, escrita na carne: sistema da crueldade; o autor propõe aqui sua máquina de guerra, apropria-se do sistema primitivo para voltá-lo contra seu regime político; não se perde na imagem do outro, descrevendo um objeto, sabe o poder que possui construir esse objeto, sua função política e a volta contra seu próprio criador, como máquina de guerra;
dessa forma, pode ser pensado como uma aplicação prática, antes do tempo, da proposta dos antropólogos associados em a construção da pessoa;

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