03 maio 2008



bakhtin coloca em xeque o estilo poético;
a forma poética, em sua tradição, definiu-se como expressão da alta literatura, de uma linguagem superior para conteúdos superiores;
o poeta como cantador dos grandes feitos, assumindo a função de historiador dos feitos do povo;
isso explicaria uma dimensão social daquilo que é definido como a gênese musical do verso;
não é só a música que definiria a distância do verso e da rima;

tomando por referência o uso social da linguagem, a fala cotidiana, o romance serve como contraponto que caracterizará a literatura moderna, em que a linguagem do indivíduo racional e liberal é alçada à matéria literarizável;

suprimida a distância entre a linguagem literária e a linguagem cotidiana, cumpre redefinir-se, agora com muito mais sutileza, em que consiste a natureza do literário;

o poema, antes definido por sua forma definida e seu conteúdo elevado, pode disfarçar-se em fragmento de conversa, diálogo cotidiano, recorte de situação;
numa poesia que pode tratar dos chinelos;

dissolve-se uma fronteira visível que redefine os critérios, os instrumentos e a sensibilidade;
a confecção e a leitura se confundem na realidade cotidiana;

bakhtin define esse processo de pareamento da literatura com seu contexto, com o mundo inacabado do qual faz parte, com o mundo que não se restringe a definir a escrita, seu material, sua forma, mas num mundo igualmente influenciável, escrevível por essa literatura;
invertendo o processo histórico, o tráfego não se á mais apenas no sentido de a realidade, o contexto, as tensões históricas definirem a texto literário;
o que se tem agora é um texto que se escreve com o mundo, com a matéria do real, uma literatura que define não só a história, como escreve o presente;
extingue-se a fronteira que distinguia ficção de realidade, que definia a ficção como imitação do real, que substantivava essa distinção, tomando o real como o duro curso dos acontecimentos e a ficção como o maleável imaginário;
o ficcional assume seu status de matéria simbólica que compõe o que é concebido como real, ao mesmo tempo que [entre outras disciplinas] a história revelará seu caráter contingente, arbitrário;

a medida que nos afastamos do século dezenove, e o século vinte intoduz suas tecnologias comunicativas que marcarão a nova face do capitalismo, é que vamos sentindo na pele o ruir dessa dura empiricidade que se constituía mesmo na identidade do real;

a princípio confunde-se o rompimento do dique parnasiano e a invasão da fluidez do linguajar cotidiano como uma mera simplificação da literatura, estigma herdado provavelmente do romance romântico, fenômeno que inaugura o conceito de mercado editorial que também competirá para a redefinição da literatura, agora em sua face de mercadoria;

com as exploração dos recursos, vamos atravessando obras como as de machado de assis, graciliano ramos, guimarães rosa, e esses recursos literários vão demonstrando a complexidade que podem atingir, sua capacidade para reescrever o idioma;

a língua falada é o múltiplo e não a unidade da língua escrita e gramaticalizada;
isso foi apreendido na prática literária muito antes e ser teorizado;

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